sexta-feira, 23 de maio de 2014

O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street) - Martin Scorsese


Com grandes filmes na carreira como Taxi Driver e Touro Indomável ou sucessos recentes como Cassino, Os Infiltrados ou Ilha do Medo, já comentado aqui, Martin Scorsese segue numa carreira bastante atuante.

Seu filme mais recente, O Lobo de Wall Street traz novamente Leonardo di Caprio como protagonista e mais uma vez na figura de um viciado, problemático, carismático e sedutor.

Di Caprio tem se especializado nesse tipo de papel, já viveu excêntricos em outros filmes de Scorsese como Gangues de Nova Iorque e O Aviador e em tantos outros como J.Edgar, Django Livre ou o mais recente muito semelhante O Grande Gatsby, comentados aqui.

Aqui seu personagem também se assemelha a um dos melhores filmes de sua carreira, Foi Apenas um Sonho, de Sam Mendes, com comentários aqui, pelo personagem de origem simples e grandes ambições.

O Lobo de Wall Street é baseado na autobiografia de Jordan Belfort, jovem que começou a trabalhar no mercado da bolsa de valores e com sua ambição e talento  se viu em uma ascendência que parecia não ter limites.

Iniciando como um mero funcionário de pregões em Wall Street, tendo que entrar no mercado de ações de empresas toscas e se tornando o maior vendedor dessas pequenas ações, chegando a criar sua própria empresa e a ampliando sem parar...

Para isso Jordan não mede esforços nem escrúpulos. Vende a tudo e a todos em busca por mais e mais (sempre vendo as pessoas como objetos de seu prazer sem se preocupar em humilhá-las ou desprezá-las de acordo com seus interesses).

E essa busca de excessos não é só pelo sucesso em sua carreira e dinheiro, é também pelo glamour, mulheres e drogas - especialmente cocaína.

Um bon vivant cínico e cafajeste da pior estirpe.


E o filme faz sua narrativa em primeira pessoa, Di Caprio é quem narra o filme e algumas vezes inclusive se dirige diretamente para a câmera (e para os espectadores). 

Ou seja, podemos ver esse encantamento pela vida fácil com ironia, já que com ponto de vista tão parcial. 

Porém, a maneira envolvente como o filme é construído: personagens carismáticos, decupagem excelente, diálogos dinâmicos, arte, fotografia e som com ritmo e brilho...

Tudo isso faz com que o filme de certa maneira defenda essa história, e nesse ponto é bastante questionável.

A sedução por esse universo vazio vai tão longe que faz com que o filme dure três horas e não nos conte tanto. Pormenoriza os sucessos e a seguinte queda de Jordan Belfort (que é pego por suas falcatruas).

Podemos seguir envolvidos pelos 180 minutos, mas ao terminar o filme, não levamos muito conosco. Muito menos somos levados a ter um olhar crítico sobre o personagem. Ele é feita de maneira suficientemente sedutor para que não o desprezemos. 

O filme toma tanto seu partido que de certa forma no final, mesmo que decadente, ainda o mostra como vencedor (ou ao menos como talentoso e influenciador).

Podemos pensar nos problemas do ponto de vista da história lembrando de outro protagonista carismático e absolutamente deprezível que é o fascista Capitão Nascimento de Tropa de Elite, já comentado aqui.

Ou ainda podemos lembrar do protagonista de Meu nome não é Johnny, também comentado aqui, que tem trajetória de vida fácil e muito sedutora (também dado pelo carisma do ator - Selton Mello, diálogos, decupagem etc) mas que, ao final, em sua queda, tem uma revisão verdadeira de sua vida e nos faz ver de maneira bem mais aprofundada o personagem e sua trajetória, chegando a relfexões mais humanas e críticas.

Muitos defendem que Scorsese não defende o personagem (e a pessoa de Belfort), mas basta acompanhar a ascenção que Belfort teve depois do lançamento do filme, passando a dar inúmeras palestras e afins, para ver o efeito e poder do filme.

A força do cinema é incrível e não podemos desprezar seus discursos, por isso a crítica a certos filmes e personagens acabam indo bem além dos aspectos técnicos, fazendo com que O Lobo de Wall Street não mereça muitos uivos.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Sob a Pele (Under the Skin) - Jonathan Glazer


O inglês Jonathan Glazer já tem experiência na direção de filmes de terror, o autor de Reencarnação chega agora com Sob a Pele.

O filme recebeu elogios de diversas revistas e jornais especializados mas ficou ainda mais famoso por ter suscitado inúmeras vaias em Cannes em 2013. E de fato o filme deixa muito a desejar.

A trama começa bastante instigante, com uma protagonista carismática, vivida por Scarlett Johansson, e diálogos truncados e envolventes. 

Vários personagens secundários que nos deixam intrigados e com lacunas que despertam nossa curiosidade e intensificam o clima de suspense do filme.

Faz lembrar o ótimo Fora de Satã de Bruno Dumont, já comentado aqui.


Entretanto a trama alienígena-vampiresca não evolui muito.

A moça que atrai homens para se alimentar deles, passa grande parte do filme fazendo apenas isso e quando esboça alguma reação (que não sabemos ser medo, arrependimento, banimento de superiores) não faz revelações além.


Ela tenta viver como uma mulher normal, mas é impossível.


E assim faz lembrar outros clássicos também como Blade Runner de Ridley Scott: replicantes poderiam viver como seres humanos?

E aqui, o que acontece com a afetividade da protagonista? Onde estão seus sentimentos, sonhos, medos?

Há algo além do que vemos sob sua pele (sempre tão exposta ao longo do filme, em nus, closes e planos detalhe), mas acaba ficando na superfície. 

A tensão de clima de suspense que percorre todo o filme não erupciona e nos deixa um pouco à margem, à deriva, como as lindas cenas de praia do filme.


quinta-feira, 15 de maio de 2014

Amante a domicílio (Fading Gigolo) - John Turturro


Com quase cem atuações em sua carreira, como Faça a coisa certa de Spike Lee ou E aí, meu irmão, cadê você?, dos  CoenJohn Turturro às vezes também se lança na direção. A estreia mais recente é Amante a domicílio.

Turturro é o protagonista Fioravante que cede aos apelos para se prostituir de seu amigo, Murray, interpretado por Woody Allen (que há tempos não atuava em um filme que não fosse dele).

A dupla de cara tanto nos instiga como nos deixa familiarizados com seus "clowns", afinal, Woody Allen, por exemplo, parece sempre fazer uma caricatura de si mesmo.

E Turturro parece ir no mesmo caminho (do homem que atrai por seu silêncio meio melancólico e instigante).

Além das expressões, também sentimos isso no texto.

Roteiro feito por Turturro, mas que dizem ter sofrido vários ajustes nas mãos de Allen, traz diálogos com traços de melancolia de desajustados e pitadas de ironias dos gauches tentando se dar bem, e que dão o humor do filme.

Fioravante aparece meio sem saber o que quer da vida, mas resignado a uma vida simplória de florista. Já Murray luta para não decair após a falência de sua livraria.

Percebe então na busca de duas mulheres por um homem para acompanhá-las num mènage a chance de ganhar algum dinheiro.

O resultado é que ele se torna cafetão de Fioravante.

Há alguma diversão e graciosidade até esse ponto, entretanto não entendemos bem os conflitos, não há aprofundamento das personagens e não fica claro o sentido da trama. 

Quando o filme tenta ficar mais dramático tampouco se sustenta. Os encontros de Fioravante com Avigal, uma judia ortodoxa que vive um luto severo pela morte de seu marido, tem potencial, mas não se aprofundam.

Ficam na superfície e resultam na "moral" mais fácil: de como essa mulher era uma flor murcha, que precisava ser olhada, tocada e regada para poder florescer.

Diversas personagens buscando prazer no sexo de maneira mercantilista (tanto por parte das mulheres que pagam, como a bem sucedida médica vivida por Sharon Stone) como o próprio Fioravante, que aceita o papel de seduzir essas mulheres e lhes dar prazer em troca de suas contas pagas.

O desajuste que parece haver nessas situações é o que tem mais potencial no filme, mas o que é menos explorado: quem são essas personagens que deixaram de ter prazer em suas vidas? Por que elas buscam nesse sexo casual a resposta? Onde estão os sonhos delas?

Uma pena Turturro não ter investido nessas lacunas e ter ido mais "avante" com seu florista, acabamos seguindo no filme meio distantes e sem grandes emoções.