terça-feira, 5 de novembro de 2013

O Grande Mestre (Yi dai zong shi) - Wong Kar Wai


O chinês Wong Kar Wai se fez conhecer por verdadeiras pérolas cinematográficas como Felizes juntos, Amor à flor da pele, 2046 ou seu segmento no filme Eros.

Filmes lindíssimos, com fotografia e direção de arte impecáveis e trams instigantes narradas em um tempo lânguido, lacônico, envolvente.

Entretanto a fórmula de Kar Wai foi se popularizando e ele mesmo começou a fazer tentativas mais pop.

Foi o caso de seu Beijo Roubado, protagonizado por Norah Jones que contracenou com Jude Law e Natalie Portman.

Ou agora em seu novo filme O grande mestre. Aqui Kar Wai se rende ao gênero "filmes de kung fu", lembrando os filmes de Ang Lee, que se excedem em plasticidade e competência técnica, mas que cansam um pouco com a história.

Baseado em fatos reais, este épico traz fortes imagens e narra os acontecimentos históricos relacionados, mas deixa a desejar na profundidade das personagens e mesmo em sua poesia.

Talvez para os fãs do gênero funcione. Para os demais resulta apenas no filme bonito.

Somos o que somos (We Are What We Are) - Jim Mickle


O fotógrafo americano Jim Mickle parece usar seu repertório na construção de seus filmes, como o mais recente Somos o que somos.

Mickle constrói cenas bonitas e de climas intensos, porém lançando mão a todos os clichês possíveis: chuva, trilha musical, maquiagem, expressões dos atores...

Somos o que somos conta a história de uma família peculiar que guarda um segredo vivendo uma espécie de seita religiosa.

O filme vai estabelecendo um crescente de aspectos de terror e acaba chegando num final patético mesmo para o gênero.

Falta Mickle assistir mais Kubrick e O Iluminado para poder aprofundar suas tramas e não seguir decepcionando espectadores.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Cortinas Fechadas (pardé) - Jafar Panahi e Kambuzia Partovi


Em Cortinas Fechadas seguimos acompanhando o drama do cineasta iraniano Jafar Panahi em sua prisão domiciliar e as maneiras que encontra para burlar a proibição que tem de fazer filmes por vinte anos (!).

Após o registro de Isto não é um filme - já comentado aqui. Panahi amplifica suas questões e torna a trama mais complexa. 

Não sabemos se as personagens presentes funcionam apenas como seus parceiros e interlocutores mas se podem ser vistos também como heterônimos dele próprio. 

Embates entre seu lado que quer continuar a qualquer custo ou que quer desistir e mesmo se matar.

Como cinema novamente faltam recursos, como discurso documental não há muita novidade em relação ao anterior, o que temos além é a dimensão filosófica dessa proibição de Panahi trabalhar.

Sua criatividade tolhida, sua falta de liberdade, especialmente a de expressão.
Gritos presos na garganta. Cálices para serem afastados. E cortinas esperando serem abertas!!!

Desigualdade para todos (inequality for all) - Jacob Kombluth


Jacob Kombluth praticamente filma uma aula do economista Robert Reich.

Reich é uma figura bastante interessante, ex-secretário do trabalho no governo Bill Clinton e professor de Bekerley fala sobre os períodos das maiores crises financeiras dos últimos séculos.

Ele descorre sobre o sistema capitalista e aponta questões de desigualdades sociais, leis, direitos e deveres de cidadãos, leis de oferta e procura, sistemas financeiros, dívidas, padrões de vida de diferentes classes sociais etc.

O carisma e retórica de Reich nos motiva e entretem, entretanto como linguagem e narrativa o filme é pobre. Apenas imagens de entrevista, umas poucas coberturas e animações que são quase como power points de uma aula.


Talvez para a TV funcione mais, para o cinema deixa a desejar.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Lições de Harmonia (Uroki Garmoni) - Emir Baigazin


Um dos aspectos mais especiais da Mostra de Cinema de São Paulo é poder conhecer cinematografias de lugares diferentes, por exemplo o premiado filme do Cazaquistão Lições de Harmonia, de Emir Baigazin.

Baigazin conta de maneira intimista e com poucas palavras a vida de Aslan, garoto que vive de maneira bastante simples com sua avó (criando ovelhas para poder se vestir e alimentar, tirando água do poço ou se vestindo de maneira modesta).

Um cotidiano simples, porém digno. Mas que Aslan tem que defender diante de uma gangue de garotos em sua escola.

Chantagens, extorsões, ameaças, roubos. Em linguagens bem distintas das nossas.

Longe da gritaria latina a que estamos acostumados, mas em resultados muito semelhantes de humilhação, violência e desigualdade.

Injustiça que vemos dentro das turmas da escola, mas que vão além: os mesmos garotos que oprimem são oprimidos por garotos maiores e também por policiais.

A harmonia do título é quase uma ironia, já que as lições parecem mais de injustiça e desamparo.


Cães Errantes (Jiao you) - Tsai Ming Liang


Criativo e excêntrico, o diretor nascido na Malásia e criado na China Tsai Ming-liang lança mais um filme no Brasil. Ming-liang é autor de obras divertidas e exageradas como o musical O Sabor da Melancia. 

Mas principalmente de obras mais introspectivas, com personagens pecualiares cheios de densidade, como O Rio, O Buraco, Que horas são aí ou o menos narrativo Adeus Dragon In.

Assim é também seu mais recente Cães Errantes, que traz uma família vivendo no limite da sobrevivência.

Acompanhamos cenas do pai, vivido pelo ator-fetiche do diretor Shiang-chyi Chen, trabalhando como "homem-cartaz";

De suas crianças deixadas um pouco à própria sorte, sem parâmetros de educação, alimentação, higiene e dos locais improvisados que encontram para dormir, tomar banho, viver...

O que há de especial em Cães Errantes não são tanto os fatos da vida precária de seus protagonistas, mas a maneira poética e lacônica como eles se relacionam. 

Situações lúdicas num limiar entre real e fantástico, entre "normalidade" e loucura e numa narrativa repleta de lacunas, que podemos preencher com pistas deixadas pelo filme ou com nossa própria imaginação e repertório...

O que é exagero de uma obra de arte? O que é o extremo possível em uma situação limite? O que é expressão não só da vida externa, mas também interna?

Impressões que ecoam e fazem com que nos relacionemos com o filme de maneira vertical, com imagens e situações permanecendo dentro de nós.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

A gangue dos jotas (la bande des jotas) - Marjane Satrapi


A iraniana Marjane Satrapi é uma artista que merece atenção. 

Seu primeiro filme, Persépolis, foi inspirado em seus quadrinhos e traziam um interessante relato sobre a condição feminina no Irã, de maneira corriqueira, casual e bem humorada.

Depois veio Frango com ameixas, romance bonito, lúdico e delicioso - já comentado aqui.


Agora Satrapi protagoniza uma crônica de realismo fantástico em A gangue dos jotas.

Ela vive uma figura bastante excêntrica, munida de humor negro.

E que se une a um casal de homens  simpático, aberto e fluído. 

Juntos eles vivem uma aventura pela Andaluzia.

Narrativa simples e que não envolve muito. Seria um bom telefilme ou episódio televisivo, no cinema fica sem graça. Ainda mais diante da expectativa que Satrapi pode nos gerar... 

O Jardineiro (bagheban) - Mohsen Makhmalbaf



Um dos principais nomes do cinema iraniano, Mohsen Makhmalbaf apresenta seu novo filme: O Jardineiro.


Este docudrama fala sobre a religião Baha'i que defende o não preconceito e a comunhão entre pessoas e natureza, principalmente as plantas, representados por um lindo jardim,  espécie de templo para os devotos.

A partir dos preceitos dessa religião, Makhmalbaf também questiona seus próprios princípios e encena situações de conflito e aprendizado entre ele, seu filho e seguidores do Baha'i.

O filme tem imagens, cenas e diálogos muito bonitos. Por exemplo a brincadeira com reflexos de espelhos, lembrando As Praias de Agnes, de Varda, já comentado aqui.

Mas no geral é simplório, pobre cinematograficamente e imaturo na linguagem. Um faz de conta que não convence muito e deixa a desejar.

La jaula de oro - Diego Quemada-Diez



O diretor espanhol Diego Quemada, bastante experiente em fotografia estreia agora na direção do longa La jaula de oro.

Interessante principalmente pelo contato com a América Central, que dificilmente chega por aqui e quando chega é sempre via México. 

Neste filme guatemalteco vemos mais uma vez jovens em busca de sonhos de futuro. Cruzando fonteiras e pondo em risco suas vidas (sendo maltratados por policiais, saqueados por bandidos, roubados, espancados, estuprados, humilhados).

Resta a eles uns aos outros, a turma de amigos que vai se perdendo. E mesmo entre eles há desconfiança e impotência neste cuidar.

Desamparo é a palavra que nos fica.

Bonita história, apesar de não ter frescor (já vimos várias vezes as tentativas de outros para chegar aos EUA) e bem contada.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Miss Violence - Alexandros Avranas


Dialogando com seus pares, Alexandre Avranas faz lembrar profundamente de Canino de Lanthimos.
Aqui também temos um universo bastante particular, violento e doentio.

O filme começa extremamente instigante, mas perde um pouco a mão em exageros, comprometendo seu realismo e a relação do espectador com a trama.


A mulher do policial (Die fraus des polizisten) - Philip Gröning


História densa e interessante em filme autoral e estiloso.

Linda forma poética e lúdica de interação entre mãe e filha. Dramática trama familiar.


Inside Lewin Davis - Joel & Ethan Coen


Irmãos Coen em boa forma, personagens autênticos agora em tom mais indie.
Talvez um pouco mais curto ficaria ainda melhor.




domingo, 13 de outubro de 2013

O Capital - Costa-Gravas


O diretor grego Costa-Gravas encara o desafio de tentar entender e explicar um pouco a que ponto do capitalismo nossa sociedade chegou. O Capital entrama personagens do sistema financeiro e seu entorno.

Gravas reúne um elenco interessante, do marroquino Gad Elmaleh, de filmes como Espuma dos Dias - já comentado aqui.

Passando pela francesa Céline Sallete, de filmes como Apollonide e De ferrugem e osso - também comentados aqui. Céline faz uma personagem secundária, mas de extrema importância para a trama, já que é possivelmente o único ponto de identificação entre filme e público.

Ou o irlandês Gabriel Byrne, que recentemente pode ser visto protagonizando a série In Treatment. e que vive o principal vilão.

Personagens frios e calculistas que se veem em xeque o tempo todo e por isso tentam sempre antecipar os passos e se colocar à frente, ou cobras que tentam comer cobras.

Narrativa principalmente baseada nos diálogos, mas apresentando um universo onde circula muito dinheiro, assim locações e figurinos esbanjam luxo e brilham aos olhos.

Também os atores que oscilam entre a aridez da esfera política e mercantilista e entre o extremo da beleza e da vida das aparências.

Muito boa a apresentação do cenário e importante por mostrar a que ponto chegamos e podemos chegar. 

Para um público mais humanista, o filme pode chegar seco demais e não envolver muito, já que busca uma relação racional com seu público sem gerar muita emoção (talvez raiva e indignação, mas com pouca identificação com as personagens). 



Mas resulta em uma boa aula sobre os tempos em que vivemos...