sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Apocalipse Now - Coppola


E já que falei das Filipinas e da Tailândia, acabei lembrando do Vietnã e do clássico Apocalipse Now do mestre Francis Ford Coppola.


Cenário tropical bem semelhante, mas sem qualquer presença do ponto de vista oriental da região...




Na verdade o olhar do filme é em grande parte o olhar de estranhamento dos americanos em relação aos vietnamitas, seus costumes, sua força, suas motivações... Estranhamento de ve-los resistir, estranhamento talvez inconformado pela derrota (não admitida) da guerra.


Mas sem dúvida que o filme vai além, fala de certo vazio existencial, e nesse sentido o confronto com a cultura e filosofia oriental enriquecem as reflexões...


Passar por situações intensas (de guerra ou do que quer que seja), pode ser um caminho sem volta, a "harmonia" nunca mais será a mesma... o desejo pela adrenalina, por saber os objetivos, sentir a busca, a luta, etc pode ser muito motivadores e "perder" isso... 

Mérito da direção em foto deslumbrante, som impecável, atores precisos (em especial Martin Scheen e Marlon Brando)... Sem falar nos cenários - naturais e/ou decorados...


Apocalipses agora que podem gerar melancolias... (ou "melancholias", para já antecipar o próximo post...).

Coppola não é entre os grandes diretores o que mais me toca e me inspira, mas seus filmes certamente permanecem... Suas imagens e personagens instigantes, diferentes, criativas, emblemáticas nos envolvem... 

E o que dizer de filmes irretocáveis como O Poderoso Chefão... Ou mesmo seu último, Tetro, que para mim tem diversos momentos irregulares, mas há uma força em seus personagens, uma elegância em sua direção, uma profundidade nas sugestões de seu drama...

Aperitive-se com o trailer de Apocalipse Now

E que venham muitos outros! Novos embates apocalípticos e dramas profundos... (como Twixt, que está a caminho...)

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Tio Boonmee - Apichatpong


E por falar em Filipinas, um dos filmes mais marcantes que vi ano passado foi o tailandês Tio Boonmee - que pode recordar suas vidas passadas.

Há alguns anos não deixo de comentar nenhum filme que assisto no cinema aqui, mas esse ficou nos "rascunhos" esperando sua vez... E não por haverem tantos na fila nem nada, mas por falta de palavras mesmo...


O filme é tão diferente, acompanha uma lógica tão distinta da nossa, traz alegorias tão fortes, tantos mistérios, enigmas e vida... Fiquei sem palavras...



Ao ver fiquei impregnada de uma simplicidade da vida do campo, somada a certa postura oriental (de respeitar e se aliar a natureza, talvez). 

Fiquei também surpresa com a proximidade que senti entre seus mitos e nossos mitos indígenas (por exemplo da moça sendo enfeitiçada por um peixe em pleno rio... tal qual a história de nosso boto...), isso talvez seja ainda mais reforçado pela paisagem de mata muito parecida e inclusive pelas feições (quando vemos alguns orientais vemos clara a possibilidade mais longínqua de nossos antepassados).

O filme que fala sobre a morte traz ainda reflexões bem poéticas, como "os fantasmas não estão ligados a lugares, mas a pessoas".

E assim as misturas de seres realistas e seres fantásticos convivem bem, em cenas cotidianas, intimistas e de grande beleza...


A beleza está no simples, e por isso me choca, e por isso me deixa sem palavras... Os ritos são outros, as crenças são outras, o ritmo é outro... Mas é belo e me emociona!


Tocada por esse estranhamento e inclusive por um final já mais crítico e mais próximo e sem muita poesia: a família que estava na mata, vivendo com a natureza, com os fantasmas, em um ritmo próprio, talvez podendo ser visto até como primitivo (?), e por isso chegam num choque na "cidade grande". 

Ali confrontos entre as pessoas e a televisão: entre o mundo árido,  opressor e turbulento de fora e o turbulento de dentro de nós, muito mais frutífero (e verde no filme)... E isso sem discurso, apenas com imagens e o viver das personagens (não com o que sentem, falam, desejam...) 

O filme passa das sombras da floresta à luz azulada do televisor... E me deixa perdida, em algum lugar no meio do caminho...

Um apertitivo no trailer!

E palmas (minhas, de cannes, e de quem mais quiser) a Apichatpong Weerasethakul! E que siga espirituoso em seu próximo rebento cinematográfico!



segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Lola - Brillante Mendoza


Não conhecia nenhum filme de Brillante Mendoza, mas sua força e narrativa é de quem tem histórias pra contar. Com onze títulos em sua filmografia (do imdb, pelo menos), pude conferir o mais recente: Lola.


Passado na não muito conhecida região das Filipinas, está ali retratada a pobreza, a humildade, a simplicidade.



E neste caso colocadas a partir do ponto de vista de duas senhoras, que parecem figuras ainda mais fragilizadas no cenário: não sabem ler, só falam seu dialeto, não entendem as motivações e comportamento de seus netos, mas nem por isso se abatem, essas duas senhoras, duas avós, passam o filme inteiro lutando por seus netos, numa dedicação comovente.


Entretanto o filme não é muito envolvente, não explora a emoção nem qualquer sentimentalidade, é árido, seco, pobre.


O registro é quase documental: em longos planos sequência numa câmera de vídeo feita na mão. Imagem pobre, cenários pobres, pouca trilha, poucos cortes... 


Um filme quase desagradável, pois no põe à frente de um drama profundo e sem dourar a pílula, a pílula é bem amarga, raspa na garganta e se faz sentir na boca do estômago.


Muito interessante conhecer outras geografias, outros costumes, outras línguas e a universalidade da pobreza e do amor de vó.
Confira o trailer!

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Outubro - safra peruana assinada pelos irmãos Vidal

Longa de estréia dos peruanos Daniel e Diego Vidal.


Outubro é maduro e instigante, mas sinto que falta algo...

As personagens áridas, que para alguns foram vistas como realistas, para mim não são. Me atraio e me interesso pelo seu cotidiano sem glamour, sem esperanças, seco e cinza (inclusive assim registrados, vide a direção de foto e de arte), porém eles estão lacônicos a um ponto que pra mim perdem um pouco a verossimilhança...

Não haver soluções para os conflitos até adensam a trama, mas não descobrir quais são os reais conflitos das personagens... Principalmente do protagonista...

Nos afligimos por ele, esperamos reações suas, ele esboça uma redenção, mas ao final não sabemos qual o seu caminho... E o que pra mim me distancia: não vejo suas motivações...


Mostrar que ele não sabe para onde seguir pra mim resulta num mérito do filme, mas não mostrar por que ele deve seguir, aí já me desconecta um pouco...

Esse excesso de aridez além de se desgastar no roteiro, na interpretação e um pouco na direção de arte e na fotografia, se desgastam principalmente na montagem, onde para reforçar o silêncio e certas não ações há sempre uma dilatação do tempo, com planos que começam um tanto antes de se ver a ação e que terminam depois delas terminarem...


Após ver as origens indígenas dos peruanos no instigante Teta Assustada (relembre) (que ganhou prêmios, abriu os olhos de público e de crítica para o cinema peruano e trouxe questões originais e profundas às telas); 


Após ver conflitos sócio-homo-psicológicos de um triângulo amoroso de região simples pesqueira da costa peruana no irregular mas denso Contracorrente (relembre), agora foi a vez de uma versão menos típica, mais simples... A classe média baixa de Lima, personagens decadentes e a falta de visão e de esperança...


Compartilho com eles a dureza, a pobreza, as dificuldades, mas gostaria de ver mais brilho. Não o brilho de paetês nem da maquiagem, nem tampouco das jóias penhoradas pelas personagens, mas o brilho interior das pessoas... 

O brilho de latinoamericanos que vem despertando o interesse das pessoas mundo afora, confirmados pelo prêmio de Outubro em Cannes em 2010 e que por todos os méritos e acertos merece muito ser visto por aqui, afinal, pensar sobre certas deficiências que ele possa ter, é pensar sobre nossas origens, de cinema, de raça, de história; e porque ver isso resultado num belo filme, vale a pena...




quarta-feira, 27 de julho de 2011

Daquele Instante em Diante - um documentário sobre Itamar Assumpção



Documentários de pessoas que nos interessam são difíceis de não serem interessantes...
Ainda mais uma pessoa complexa, camaleônica, multifacetada, talentosa como Itamar...



E no meu caso o documentário vem com sabor de nostalgia - tanto por já ter trabalhado com entrevistados ali, como Anelis Assumpção; por já ter trabalhado na produtora do filme, Movi&Art, inclusive quando ele estava sendo feito. 

Mas principalmente por ter uma mãe fã dele desde que me entendo por gente e que me fez ouvir à exaustão algumas músicas, a ponto até de eu ter várias ressalvas a ele na infância.



Mas ao ver o documentário não vieram as ressalvas... Veio só o prazer de me deleitar com as músicas, as composições, a irreverência... (e também o agradecimento à minha mãe por ter me levado em shows e ter me doutrinado antes de se ir ao beleléu)




Como em outros documentários de pessoas que já se foram, essa também é uma reflexão que vem à tona: a vida, a morte, a brevidade, a permanência... Músicas para ecoarem para sempre por aí...



Para exalarem como suas orquídeas (para mim passagem das mais emocionantes no documentário, quando sua mulher fala da paixão dele ao cuidar e de quando passou a se desfazer delas, poético símbolo da despedida da vida).

Quanto aos comentários cinematográficos: seleção musical mto boa; de participações tb; abordagem intimista com entrevistados mto bem-vinda (exceto qdo um pouco artificial como no exagero de tantos cafezinhos);


O mosaico que vai se montando também dá riqueza à figura de Itamar (embora eu sinta falta de ir ainda mais além) e a falta de mais imagens e em melhor qualidade é uma lástima que o próprio filme explica (de certo descaso da mídia com ele). 




Mas temos agora um bom documentado, dirigido pelo diretor de publicidade Rogério Velloso, novato por essas bandas da sétima arte...

Fica ainda a vontade de algo mais, de mais diálogos entre os parceiros de Itamar, de mais músicas, de mais composições, de mais facetas, mas parece um bom e simpático registro!
Confiram no trailer!
E nos cinemas!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Schnitzler X Kubrick

Encantada com Arthur Schnitzler após ler Crônica de uma Vida de Mulher (há cerca de ano e meio).

Me deparei com uma edição de Breve Romance de Sonho. Peguei sem pestanejar e comecei a leitura...


De repente a narrativa começa a se tornar familiar... E na contracapa a confirmação: livro de inspiração para De Olhos Bem Fechados do mestre Kubrick...



A cada página ia recordando cada cena do filme e percebendo a fidelidade do cineasta...
(O médico e sua rotina profissional e a vida familiar ao lado de sua esposa e a pequena filha. Círculo de amigos bem situados, rotina de pessoas bem sucedidas, encanto de um início de casamento se esmorecendo, jogos de sedução e ciúmes ressurgindo...).

Mas nem assim o filme me convence...

Muito bem construído, narrativa sedutora, bonita, misteriosa, intrigante... Mas o desfecho...
Justo eu que gosto de narrativas desamarradas, finais abertos, mas nesse caso o fio solto não me leva a muitos lugares...


Lendo o livro me aprofundo mais em alguns caminhos.

O ciúme inicial é ainda mais plantado do que no filme.



O casal harmonioso e aparentemente feliz que começa a se deparar com o tédio de uma relação já há muito estável.


O próprio livro leva a uma caracterização fria, sem muitos arrebatamentos ou personalidade, mas ainda assim o casting de Tom Cruise e Nicole Kidman não me agradam...

Falta certa ambiguidade em Tom Cruise, que no livro se intui mais e sobra certa afetação em Nicole...


E o suspense da seita misteriosa (baile secreto de pessoas desnudas e lascivas) perfeitamente retratado no filme, no livro ecoa de maneiras diferentes... 

Em um sonho da esposa do médico, em um final onde se plantam reflexões mais profundas, de como não nos contentamos apenas com buscas do dia-a-dia, de uma vida estável, organizada, feliz... 

A felicidade precisa ser alimentada, temos um gosto especial pela novidade, pela aventura, pelo mistério... Segundo Kubrick o filme é sobre o medo, mas eu amplio esse medo a um desejo pelo desconhecido...

Somos chamados a aventuras e por isso o livro/filme pode intrigar tanto...

Mas o próprio livro (e talvez o filme também em menor escala) sugerem que essas aventuras podem ser vazias e que nossos próprios fantasmas em geral estão dentro de nós, em nossos sentimentos (em nossos, medos, ciúmes, desgostos, rancores, tédio...)

Um livro fechado em si, mas aberto por não chegar a respostas...

Um filme para sermos seduzidos (impecável produção) de olhos bem abertos, mas com o minhas retinas se frustram por me abrir tanto... Sinto que falta receber mais em troca...
Talvez mestre Kubrick ainda tivesse algum retoque, já que morreu logo após o fim da edição.
Ou fosse isso mesmo, seu olhar duro, seco e sem respostas do fim da vida...

De qualquer maneira prefiro sua inquietação juvenil... Laranja Mecânica que o diga!

E não desconsideremos o mestre, que ainda assim, não perde a majestade!
(Olhos no trailer!)