domingo, 6 de novembro de 2011

Fausto - Sokurov

Sokurov já é um nome importante entre aqueles que acompanham a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Ali apresentou títulos como o badalado Arca Russa


O interessante O Sol; o excelente Pai e Filho...


E agora o belo Fausto, vencedor do Leão de Ouro em Veneza em 2011.

Difícil e ousada é a missão de Sokurov de adaptar a história de Goethe, mas o diretor cumpre sua missão apresentando belíssimas imagens;




(primoroso trabalho de animação na abertura do filme e competente trabalho de direção de arte e fotografia);

Interpretações densas e precisas, ritmo intenso, drama crescente com as questões profundas de vida, morte e amor trazidas por Goethe.




O filme tem uma linguagem difícil e cansativa, é preciso uma entrega, mas a recompensa vale!


Attenberg - A. Tsangari

Não é a toa que esse filme da jovem diretora grega Athina Tsangari me lembrou o filme de Giorgos Lanthimos, Canino. Afinal, ela também estava envolvida na produção e aqui ele participa como ator.

Nos dois filmes vemos conflitos densos a partir de personagens nada convencionais. Em Canino, a premissa do pai que isola sua família do resto do mundo parece justificar um pouco a estranheza das personagens. Mas aqui, em Attenberg, a premissa não é tão justificável. 


Até vemos o mesmo isolamento familiar, mas ele está apenas no comportamento: uma filha que acompanha o tratamento de seu pai em fase terminal e se despede dele, buscando sua emancipação.




Precisa e belamente interpretada pela jovem Ariane Labed, que inclusive ganhou prêmio de atriz em Veneza por esse trabalho:

A protagonista, a jovem Marina, de 23 anos, tenta se desligar do pai, descobrindo e explorando sua própria sexualidade, até então abafada.
Ela age com uma espontaneidade e uma excentricidade, como se de uma criança que não se relacionou com o mundo - parece até uma continuação de Canino


E é nessa excentricidade que está o frescor, a força, a sedução do filme: há quadros quase que de um musical, onde Marina e sua melhor amiga fazem passos de uma espécie de dança contemporânea;


Há diálogos desencontrados e poéticos; há cenas em que as personagens se relacionam como animais, se aproximando do programa de animais, comandado por Attenberg, que dá nome ao filme...




De maneira nada convencional, Athina fala de temas profundos como a morte e o incesto e traz representações performáticas, artificiais, mas ao mesmo tempo muito verdadeiras. Bastante estranho, mas bastante interessante! Seguem os gregos nos instigando!



sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Respirar - Karl Markovics


Primeiro filme do ator austríaco Karl Markovics. Talvez venha daí o talento do casting e a primorosa direção de atores.
Mas os méritos do filme não param aí: tema delicado sobre prisão juvenil, ser órfão, ser doado, ser contraventor, ser rebelde, buscar ar...


A história de um jovem de 19 anos que está para terminar uma pena de alguns anos, devido a crime que cometeu anos atrás. 


A maneira dura como ele interage com seus colegas de prisão, com seu tutor, com colegas de um trabalho que inicia em um necrotério... Tudo ao redor é cinza e ele tem uma atração intrigante por essa morbidez. 


Talvez por não se identificar com as coisas coloridas e alegres, talvez por não se sentir pertencer, talvez por sonhar em ir pra longe...




A história de Kogler vai sendo contada aos poucos, como em um quebra-cabeças, e o silêncio e as lacunas que sentimos vão nos estimulando, a aridez instiga e ao mesmo tempo sufoca um pouco no decorrer.

Até que o paralelo do título, das aulas de natação de Kogler e o desejo de mais ar e brilho nesse universo árido e cinza ganham sentido com a história de seu passado...

Bom filme. Eleito melhor filme pelo júri na 35a Mostra (o que talvez eu discorde, já que entre os que vi eu preferi Oslo, 31 de Agosto, por exemplo), mas de qualquer maneira um filme que merece ser visto!


Combat Girls



Drama instigante do alemão David Wnendt, em que se aventura no polêmico tema da intolerância e diferença de culturas a partir de um grupo de jovens neonazistas na Alemanha.


Difícil estar próximo de personagens que ridicularizam, maltratam e chegam a matar pessoas de outros países, etnias, culturas, opiniões.


Mas o filme traz as Combat Girls e suas personagens fortes e vibrantes, atuações muito boas (rendendo prêmios na Mostra, inclusive);

E uma câmera e linguagem tão vigorosa, que nos interessamos por elas e queremos saber mais e mais, até pra entender seus pontos de vista, buscar humanidade em pontos de vista tão desumanos...



Mas o filme não chega a fazer um embate de idéias e nem defende ou condena pontos de vista. 

Ele mostra as idéias e ideais desse grupo nazi, mostra suas atitudes violentas e intolerantes e mostra o peso na consciência da protagonista pelos males que causa. 


Mostra também um caminho sem volta em que ela se coloca, mas sem melodramaticidade e sem muita redenção ou reavaliação de seus atos.

Combat Girls acompanha a secura e dureza desses jovens sem muito amor e respeito aos próximos e aí está seu impacto e qualidade.

Realmente vale a pena como um recorte e mesmo sem que ele nos envolva a nos aproximar tão intimamente das personagens, nos dá material para muitas e profundas reflexões.


O jovem diretor David Wnendt cumpriu bem o desafio, esperemos os seguintes...


Elena - Zvyagintsev


Conheci o diretor russo Andrei Zvyagintsev em seu longa de estréia O Retorno em outra edição da Mostra

Quase dez anos depois, Andrei volta com Elena.

Novamente um filme dramático, com personagens duras, lacônicas, graves. Narrativa construída pouco a pouco, com tempos lentos e envolventes e diferentes camadas de intenções, sentimentos, motivações...

Porém em Elena vão havendo tantas surpresas e ao mesmo pouca revelação: o convívio entre Elena e seu marido rico e sovina, suas opiniões sobre a desamorosa e cruel filha dele;

Ou sobre o filho vagabundo da própria Elena e seus netos, que esperam, sem nenhum esforço, sair da vida precária em que vivem.

Todo esse contexto em um desenrolar dado a partir da debilidade da saúde do marido de Elena. 

Esperamos ver surgir sentimentos diante de camadas de ressentimentos, frustrações, avareza, preguiça, cobiça, luxúria, tédio... 

Mas os sentimentos não vem. A maldade das personagens é o que impera e por um lado instiga, mas por outro chega ao limite do verossímil, e com isso me afasta um pouco...

Apesar de diferentes personagens, acontecimentos e curvas, o filme para mim parece monocórdico, o que é pelos cenários ou de um apartamento de classe alta sem personalidade ou por bairros periféricos. 


A repetição também é frisada pelo som e, principalmente, pela foto, sempre azulada.

Fica o excelente trabalho de tempos, dado tanto pelas boas interpretações, em especial da protagonista, vivida por Nadezhda Markina, quanto pelo roteiro e pela montagem...


quinta-feira, 3 de novembro de 2011

The Day He Arrives



Interessante filme do sul coreano Sang-soo Hong.



Com uma premissa e situações simples: cineasta de uma província vai a Seul encontrar um crítico de cinema. Ali ele participa de várias conversas de bar, mas mais do que isso ele mostra sentimentos e pensamentos à flor da pele.


De maneira estranha, com atropelos, arrebatamentos, radicalismos... Ora prosaico, ora intenso, o protagonista fala sobre cinema, sobre relações e sobre o amor... 


E mais sugere e aponta, do que constrói propriamente... E aí está a originalidade e o interesse em The Day He Arrives.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Las Acacias - Pablo Giorgelli


Excelente estréia em longas do diretor argentino Pablo Giorgelli!

Las Acacias é um filme simples, singelo, delicado, mas extremamente humano e tocante.

Se aproxima de outros argentinos como O Cachorro de Carlos Sorin (que em seu último, Desaparecimento do Gato, já não se mostrou tão potente).

E me faz lembrar um pouco Central do Brasil de Walter Salles, apesar de mais adocicado e em linguagem mais clássica, mas também com personagem de um caminhoneiro pelas estradas latinoamericanas;



E que apresenta a dureza e gradual enternecimento de personagens como Dora, vivida por Fernanda Montenegro ou Rubén, vivido por Germán de Silva (foto ao lado).



Las Acacias mostra a relação entre um caminhoneiro e uma mulher que tem que transportar do Paraguai até Buenos Aires. 


A mulher está com sua nenê de cinco meses (por sinal um achado de simpatia e entrega).




E isso causa alguns distúrbios na rotina do homem rude e desacostumado com companhias (e principalmente com choros inoportunos, paradas para amamentações e trocas de fralda etc)...




Não há grandes conflitos, ações ou reviravoltas, apenas a interação ali entre as três personagens. Mas essa interação é feita com intimidade, proximidade e simplicidade que encantam e envolvem de maneira sincera.




Histórias da Insônia - Jonas Mekas

Outro diretor desconhecido até então para mim é o cineasta independente Jonas Mekas. Lituano de 88 anos, vive em Nova Iorque há tempos e se destaca ali por seu cinema documental-experimental, nessa Mostra apresentou uma interessante premissa:

Registrar suas andanças noturnas, que demonstram sua busca por coisas bonitas antes de dormir...


Nesses registros conversas, festas, bares, restaurantes... Amigos e personalidades como Yoko Ohno, Björk, Louis Garrell, entre tantos outros...




Os diálogos super realistas são muitas vezes interessantes... Por suas temáticas, por sua simplicidade ou até por estarem desconexos.



Entretanto o filme para mim se excede em sua "despretensão" artística... O desejo documental que coloca os fragmentos acima de tudo, para mim resulta em uma pequena colcha de retalhos incômoda.

A câmera é excessivamente despreocupada com aquilo que registra: não há foco, não há enquadre, não há cortes, não há edição de som... Ao menos nada disso se vê... (Claro que em não haver já há uma existência e nisso grandes complexidades e paradoxos, mas...) 

Para mim acabam resultando em um filme tão descuidado, que me dá mais vontade de ir ler um livro, assistir a alguma entrevista das personagens que participam ali ou simplesmente buscar minhas próprias considerações sobre os tantos assuntos abordados...

Vi comparações desse filme com realities shows, porém com pessoas e assuntos interessantes, mas para mim, sem interesse em realities e em busca de experiências cinematográficas, a forma desenquadra o conteúdo, literalmente...


Talvez valha uma nova tentativa, pois a primeira foi reprovável.




Hanezu - Naomi Kawase


Ainda não conhecia nada da cinematografia da jovem diretora japonesa Naomi Kawase (apesar de diversos títulos de curtas, documentários e ficções, que até já lhe renderam retrospectivas por aqui...).


Me deparei então com seu longa mais recente na Mostra (infelizmente com péssima cópia): Hanezu.

Filme intenso.


Intensidade parece a palavra mais adequada pelo paralelo que traz entre uma história de personagens contemporâneas e lendas envolvendo a natureza.

Também pelas expressões densas das personagens, pela temática dramática e complexa de triângulos amorosos, decisões de vida, gestação, crises profissionais, etc e tudo tratado com sutileza e delicadeza.

O mais encantador do filme são os silêncios e as lacunas, aquilo que o filme te leva a preencher em personagens muito interessantes e nada convencionais. Nada dito, mas cheio de sentimentos e reflexões. 

Hanezu parece um filme extremamente poético e de grande profundidade. Me deixou curiosa para adentrar mais no instigante universo de Kawase...