quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Elis - Hugo Prata


Estreando em trabalhos em cinema, Hugo Prata se viu no desafio de contar a história de uma das maiores estrelas da música brasileira de todos os tempos: Elis.


A pretensão do filme era grande, já que sabia lidar com inúmeras expectativas e o resultado final acaba bem competente. 

Competente também a atuação da estreante Andréia Horta, que reproduz com maestria os gestos e sorrisos da cantora, auxiliada pela fotografia e decupagem, que também buscam seus melhores ângulos.

Evidente que muito fica aquém: faltam músicas, faltam personagens, falta intimismo (o mesmo com que Elis se expunha e se entregava em suas interpretações musicais), falta profundidade...

Por outro lado, está tudo ali, é um pout pourri muito bem amarrado que dá conta de contar a trajetória biográfica, ressaltar os principais trabalhos, amores, desafios e, claro, sucessos.


Um filme humano, com seus defeitos mas onde se sobressaem as qualidades e o prazer das duas horas relembrando Elis.

Mais uma vez um filme de deleite para fãs. Ouvir as músicas e relembrar a artista e dessa vez contado como ficção (recentemente vimos muitos outros exemplos de filmes musicais, mas com abordagens documentais:

Dominguinhos, What happened, miss SimoneAmy, ou Janis, por exemplo - já comentados aqui.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Labirinto (Labyrinth) - Jim Henson


Experiente diretor da série Muppets, Jim Henson se aventurou por outros filmes lúdicos e fantásticos como Labirinto, dirigido no fim de sua carreira.

O filme conta a história de uma jovem que impaciente com seu pequeno irmãozinho, deseja que ele desapareça. 


E seu desejo é atendido: o bebê é levado por duendes, que o levam para os domínios de seu rei.

O filme é protagonizado pela jovem Jennifer Connelly, em um de seus primeiros papéis, e seu antagonista é ninguém menos que David Bowie.

Um clássico juvenil dos anos 80, que tem uma premissa universal e eterna, mas que envelheceu na direção. 

O ritmo, os efeitos, as atuações hoje soam lentas e caricaturais, valendo mais pela nostalgia do que pela fantasia.

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Dois dias em Nova Iorque (2 Days in New York) - Julie Delpy


A atriz e diretora francesa Julie Delpy parece ter mesmo se envolvido com o projeto de Antes do Amanhecer / Pôr do Sol / Meia-Noite - já comentados aqui.


Além de ser co-roteirista desses filmes, ela também explorou o formato para seus próprios filmes.


A partir de uma premissa de encontro, deixar os atores contracenarem com espontaneidade, em diálogos nem sempre objetivos, tendendo mais ao filosófico ou fútil, resultando em um realismo prosaico do cotidiano. 


Foi assim em seu primeiro longa Dois dias em Paris, ou em O Verão do Skylab - também comentado aqui - ou em um de seus filmes mais recentes Dois dias em Nova Iorque.

Novamente Julie Delpy interpreta uma mulher de meia idade vivendo questões com sua família, seus parceiros e filhos, no mesmo tom entre reflexivo e histriônico, muitas vezes se excedendo em uma caricatura de si mesma.

Não à toa ao seu lado está o comediante Chris Rock e ao redor personagens coadjuvantes absolutamente exagerados para viver o encontro de duas famílias e culturas (francesa e americana) e a convivência em uma das maiores megalópoles do mundo.

Julie tem graciosidade na direção, mas acaba perdendo o caráter intimista e naturalista do formato. E também a profundidade de algumas discussões como a liberação sexual, uso de drogas, papel da arte etc.


E se aproxima mais de diretores como Woody Allen ou Cédric Klápish do que de Richard Linklater.


O resultado final é uma comédia verborrágica, com momentos lúdicos metalinguísticos e de fantasia de suas personagens, que ao invés de "crônica" faz uma espécie de "charge" do cotidiano. 

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

La La Land - Damien Chazelle


Após a estreia de sucesso com Whiplash, o jovem Daniem Chazelle revela toda sua paixão por hollywood e os musicais em La La Land.


E a sincera homenagem está rendendo: bilheteria, boas críticas, sucesso, indicações, prêmios...
As pessoas parecem sedentas de magia, mas o filme pode deixar a desejar nessa construção.

Seus protagonistas são jovens que tentam a vida artística em hollywood. Emma Stone é a moça que quer ser atriz e Ryan Gosling o jovem que quer viver de jazz.

Na apresentação de suas vidas e cotidianos começam as cenas de musicais, mas sem explorar muito o que os musicais têm de mais rico: uma transição para um universo paralelo, um mundo lúdico, de sonhos, de desejos, de pensamentos e sentimentos.

Não, a expressão de suas canções não são muito reveladoras e nem emotivas, tendem mais ao cotidiano e nos tragam pelo ritmo de melodias, decupagem, cenários encatadores e carisma dos atores (tampouco pelos seus dotes musicais ou talento de interpretação).

O mesmo se dá na apresentação dos conflitos. Não vemos os personagens sofrendo propriamente, travando lutas por seus sonhos ou nada parecido e assim o envolvimento segue superficial.

Eles se conhecem, apresentam diferenças, se atraem, mas o crescente da relação não se dá no conhecer pouco a pouco, estratégia típica e sedutora das comédias românticas (sejam musicais ou não).

Em algum momento o rapaz sugere à moça que ela escreva os próprios textos em que possa atuar, e sem grande "necessidade", fervor ou brilho, ela segue o conselho.

O rapaz ouve comentários sobre sua vida errante e incerta e decide aceitar um convite para uma banda de pop jazz, e se entrega a essa nova rotina, que lhe traz sucesso, dinheiro, reconhecimento, mas o distancia de seus princípios e ideais. 

Uma situação complexa e cheia de ambiguidade, mas que não parece vivida a fundo (e nem a raso) por ele.

E as vidas e o relacionamento dos jovens segue numa narrativa morna e longa, se redimindo apenas com um final imperfeito, mas delicado e bonito.

Um refresco suave para os olhos e ouvidos, do qual o público parecia estar sedento. Chance para se alienar e possivelmente se entreter um pouco (não o meu caso).

O Começo da vida - Estela Renner



A brasileira Estela Renner escolheu um tema interessantíssimo para sua investigação: O Começo da Vida. 

Para isso fez dezenas de entrevistas com diferentes profissionais em diversos países, mas qual foi exatamente o propósito?
Não há um conflito em sua premissa, não há uma dúvida específica a ser explorada e daí o que poderia ser um dos grandes méritos do filme (não se fechar em respostas óbvias e rasas) se torna também seu ponto de desequilíbrio.


Vários temas passam pelo filme: formação biológica, deficiência, nutrição, hábitos, aprendizado, pedagogia, cultura, criação, mater/paternidade gay, desigualdade social etc.


Mas o filme flana sobre os assuntos e acaba não se aprofundando tanto sobre nenhum.

Gestação, parto, amamentação, aprender a andar, aprender a falar, começar a brincar, lidar com amor, com a raiva, o ciúmes, o limite, o conflito entre a dependência e a independência, tudo é pincelado ali.

Talvez editado como uma série, em capítulos que dialogassem e que fossem dando esse complexo panorama do início de nossas existências e os legados transmitidos gerações a gerações todo esse conteúdo pudesse brilhar mais.

A narrativa acaba despertando interesses, tendo diversos momentos de encantamento (o tema e os personagens mirins são realmente sedutores), sendo muito promissor, mas se ofuscando pelo seu excesso de elementos.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Cinzas e Diamantes (Popiól i Diament) - Andrzej Wajda


Produtivo diretor polonês, Andrzej Wajda foi homenageado na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo em 2016, por triste coincidência, alguns dias após ter falecido.


Mas sua vida foi profícua e produtiva e entre seu legado de mais de 50 filmes está Cinzas e Diamantes, de 1958.

Cheio da vivacidade e singularidade dos cinemas novos que começavam a despontar na metade do século, a história passada no fim da 2a Guerra Mundial mistura política, história, romance...

Aparentemente sem muita conexão, mas onde tudo está bastante conectado, a geléia geral da época era posta em prática nesse exemplo da sétima arte.

Vê-lo agora requer olhar histórico e uma certa disposição, não tanto pela história e seu conteúdo, mas por sua forma. A narrativa não tradicional tem exageros, caricaturas, tempos não realistas e muita irreverência.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Sami Blood - Amanda Kernell


A jovem diretora sueca Amanda Kernell mostra sensibilidade e potência em sua estréia em longa-metragem com Sami blood.


O filme conta a história de Elle Marja, uma garota de 14 anos, que faz parte da tribo indígena do povo Sami, em território sueco. 

Passado na década de 30, vemos o isolamento e preconceito vivido por esse povo diante dos demais europeus.

Em tempos de guerra e higienismo, qualquer diferença era marginalizada e inferiorizada e esse é o principal sofrimento de Elle. 

Inteligente e curiosa, Elle não quer limites para sua vida, quer conhecer e desbravar e por isso acaba renegando suas origens para tentar se integrar melhor.

A premissa por si já é bastante interessante: trata de uma realidade muito pouco conhecida, e que, apesar de passado quase um século, ainda bastante atual, fazendo inclusive lembrar de nossa obra-prima Serras da Desordem, de Andrea Tonacci, que retrata os conflitos e contrastes da cultura ocidental brasileira e de nossa cultura indígena.

Mas mais do que isso, o mérito do filme está em sua direção: o tratamento delicado, intimista e preciso de Amanda Kernell.

A maneira como nos faz nos aproximar da protagonista, emprestarmos seu olhar, sentirmos os mesmos cheiros, ouvirmos os mesmos sons, termos os mesmos deslumbramentos, desejos, vergonhas, revoltas...


Um banho de arte e cultura. Filme verdadeiramente raro e precioso, poesia pura.