terça-feira, 6 de agosto de 2013

Marina Abramovic: the artist is present - Matthew Akers, Jeff Dupre


A dupla Matthew Akers e Jeff Dupre documentou a exposição de retrospectiva da obra de Marina Abramovic realizada no MoMa em 2010.

A partir da elaboração e execução dessa exposição, Marina e as pessoas em seu entorno (parceiros, artistas, curadores, críticos, amigos, ex-maridos etc) se colocam presentes para uma reflexão sobre sua persona e sua arte.

Quem é Marina? (ou quem são Marinas). E onde ela está presente?

A moça que foi educada dura e militarmente por pais guerrilheiros e dirigentes do partido comunista na Iugoslávia. A que foi mimada pela avó religiosa. A que viveu a juventude nos intensos e libertários anos 60 e 70. A que sempre buscou seus próprios limites, seus próprios parâmetros, seus próprios conceitos e fazendo disso sua arte.

Vemos também a Marina que está na correria burocrática da produção de uma exposição. A que está introspectiva por sua retrospectiva. A que está em harmonia com seu estilo de vida e que medita e ensina pupilos. A que está presente. Mas como?

Desde as primeiras performances Marina investigava os significados dos gestos e testava os limites do corpo. Explorava as marcas que vão sendo deixadas em nós por nossa cultura, nossos hábitos, nosso gênero, nossos pais, nossos amores...


Na investigação sobre o gênero, descobriu sua "cara-metade" Ulay, artista alemão com quem criou e atuou em diversas performances.

O filme explora a relação que eles tiveram no passado (das parcerias artísticas à do casamento) através de suas lembranças e trechos dos registros das performances.

Além disso documenta seu reencontro. Nesse sentido talvez crie cenas artificiais demais, buscando emoções que poderiam soar muito construídas, não fosse a autenticidade e intensidade dos envolvidos.

Marina também se faz presente em breves depoimentos ao longo de ações corriqueiras que são registradas (cozinhando, tomando banho, se deslocando) ou em intervalos de seu intenso cotidiano.

Mas, principalmente, Marina se faz presente na principal performance que integra sua retrospectiva no MoMa: The Artist is Present.

Marina elabora uma nova performance na qual se coloca presente pelos três meses de exposição. Apenas Marina em uma sala recebendo pessoas e trocando olhar com elas por quinze minutos.

Em princípio é fácil acompanhar a concepção da performance e repetir a pergunta tão ouvida por Marina em toda sua trajetória: "isso é arte?".

Com a abertura da exposição começamos a ver que pode haver um significado importante com esse gesto. Mas só com o passar do tempo (foram mais de 700 horas em que Marina esteve ali presente) e com as diferentes reações do público que vamos tendo a dimensão de seu gesto.

Começamos a descobrir a Marina que transborda de amor e que quer compartilhar esse afeto dedicando quinze minutos de olhar puro, direto e por isso tão intenso a cada um que se interessa por se sentar à sua frente.

Vemos pessoas estranhando, se constrangendo, julgando, mas, principalmente, vemos pessoas se comovendo por se sentirem olhadas verdadeiramente. Vemos a emoção de pessoas que se sentem reconhecidas, tocadas, amadas...

Como um terapeuta que pode "libertar" um paciente pelo simples gesto de escutar, Marina parece libertar e engrandecer pessoas com o simples gesto de olhar.

Carência dela que precisa de interlocução para seu amor intransitivo? Ou generosidade sem limites?

O que é certo é sua singularidade. E como essas questões que suscita faz com que os formatos da arte possam seguir sendo transformados, que o papel da arte possa seguir sendo questionado, que as performances que parecem tão datadas e desgastadas possam se renovar e que a própria Marina possa se reinventar a partir de si mesma.

Linda experiência. Feliz de quem pode estar presente ao vivo. Mas feliz também os que podem ver o filme. Marina Abramovic: the artist is present.

Presente para nós.




quinta-feira, 18 de julho de 2013

A Espuma dos Dias (L'écume des jours) - Michel Gondry


Um dos grandes nomes do videoclipe mundial, Michel Gondry há tempos incursiona por outros formatos, como documentários, séries e também longas-metragens, dentre eles Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças ou Rebobine, por favor - ambos comentados aqui.

O primeiro explorava a linguagem em busca de sentimentos abstratos - o desejo de se esquecer alguém após um término doloroso de relação, questões sobre o luto, o amor, a dor, a cumplicidade, o ciúmes, escolhas etc. 

O segundo uma brincadeira de linguagem, no qual os personagens tentam refilmar clássicos pop do cinema americano sem nenhum recurso - despretensioso e com potencial, mas num resultado regular.

Agora, em A Espuma dos Dias, Gondry tenta novamente retratar situações e sensações etéreas e para isso lança mão de todo seu repertório visual: animações, stop motion, cenários, figurinos, grafismos, decupagem etc etc etc.

Isso na primeira metade do filme se torna bem cansativo, pois há a construção de situações fantasiosas cheias de beleza, mas sem muito significado. 

Apenas o idílio entre dois jovens, interpretados por ícones do recente "star sistem" francês: Audrey Tatou - que ficou conhecida já dentro do universo fantástico, com o filme Amelie Poulain, do grande diretor francês Jean-Pierre Jeneut;

E Romain Duris, que tem se dividido em filmes mais "cabeça", como Exílios, mas que já se aventurou também em comédias românticas, caso de Albergue Espanhol e suas continuações - brevemente comentadas aqui.

Em A Espuma dos Dias não há cuidado na construção das personagens, nem profundidade nos acontecimentos narrados, por isso o excesso de esteticismo se torna cansativo.

Diferente de Brilho Eterno no qual os personagens também não tinham muitas camadas e muita elaboração, mas suas questões eram apresentadas no início do filme e por isso o envolvimento se dava mais fluido.

A comparação entre os dois filmes vem naturalmente, porque na segunda metade de A Espuma dos Dias começamos a ver o conflito: durante a lua de mel da garota, ela contrai uma doença e vai sendo consumada por ela.

Não apenas sua saúde vai se consumando, mas a fortuna do rapaz para tratá-la, a saúde dele a partir do momento em que começa a trabalhar desesperadamente para custear o tratamento dela;

E também nas relações paralelas, seja no mordomo do rapaz ou em seus amigos, seja por questões emocionais, financeiras ou outras...

Os melhores amigos do casal, por exemplo, vivem um conflito pelo homem ficar viciado na teoria de Jean-Sol Partre (trocadilho claro e com citações durante o filme que mostram uma forte relação de Gondry com a poesia e a filosofia) e isso o consome como se fosse heroína. 

Sua companheira, fica consumida pela impotência diante do vício do companheiro e pelo amor que se esvai no desenrolar dessa situação, sem chances de contorno.

Essas consumações de que tratam o filme são todas retratadas em metáforas visuais e se dão em tempos e em ritmos muito subjetivos, na mesma sensação de concretização de abstrações de Brilho Eterno.

A própria doença da garota é extremamente poética: ela inspira uma flor de lótus e essa flor cresce dentro dela, contaminando e tragando seu pulmão.

Mas o filme peca pelo excesso, ao invés de investir na delicadeza das metáforas e em cenas mais intimistas, fica buscando o tempo inteiro imagens criativas e mirabolantes e com isso se arrisca em distanciar os espectadores.

Muito potencial na história e mais ainda em Gondry, mas que com mais seletividade teria mais
profundidade e poesia.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Entre Vales - Philippe Barcinski


Desde seus primeiros filmes, ainda na faculdade, Philippe Barcinki já mostrava o potencial de seu talento.


Entre seus curtas estão os premiados Palíndromo e A Janela Aberta. Agora ele lança seu segundo longa: Entre Vales.

O maior mérito do filme é sem dúvida a história, tanto a premissa como as nuances do roteiro: um homem visto em dois momentos de sua vida: em uma vida miserável em um lixão e em sua vida como pai de família classe média.

A construção desses ambientes também é muito rica, com boa decupagem, fotografia e arte e excelente escolha de ambientes, nos interessamos por essa vida dupla. 

O lixão, aliás, tem possibilitado muitas reciclagens em nosso cinema, seja no excelente documentário de Coutinho - Boca de Lixo, no poético e profundo Estamira ou no mais recente Lixo Extraordinário - já comentado aqui.

O filme vai criando a expectativa de como essas histórias irão se encontrar. Terá ele sido descoberto no lixão e subido de vida? Terá ele levado uma rasteira? Serão dois mundos paralelos, duas possibilidades de existência?

Questões bastante intrigantes e envolventes. Mas que são prejudicadas por um certo problema de ritmo do filme. 

Os diálogos não fluem como deveriam e em alguns personagens faltam mais nuances de personalidades  ou repertório de gestos e tons para que tenham mais profundidade (a que essa trama e esse filme pedem pelo menos).


Essa já era uma deficiência do longa anterior de Barcinski: Não por Acaso, que também tinha um ótimo roteiro e personagens bastante interessantes, não nos envolvia como poderia.

E não é questão de elenco, nem no anterior e nem nesse, pois aqui Ângelo Antônio faz um trabalho bastante denso e dedicado, assim como outros coadjuvantes, por exemplo os companheiros do lixão.

Uma aparada de arestas e Barcinski poderá fazer fluir suas grandes histórias. Ideias e argumentos para isso não lhe faltam!

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Universidade Monstros (Monsters University) - Dan Scanlon / Pixar



Após o grande sucesso de Monstros S.A., a Pixar resolve investir em uma nova história com os mesmos personagens em Universidade Monstros.

Ao invés de contar a sequência da história, preferiram contar a história pregressa: os sonhos da tenra infância de Mike de trabalhar na Monstros S.A.

A trama se foca no momento em que ele entra na universidade e tem que enfrentar os desafios para se tornar o Mike que conhecemos do outro filme. 

Lá que ele conhece os principais personagens de Monstros S.A. também, mas em relações bem diferentes das do outro filme: os que eram amigos ali ainda não são e de outros que são amigos se semeia em como se tornarão inimigos.


Personagens divertidos, mas em uma trama bem menos original do que a primeira. 


Contar uma história para crianças sobre monstros que as assustam, mas a partir do ponto de vista deles foi realmente uma ideia muito criativa e divertida.

E ainda contava com a graciosidade da personagem da menina Bu (mesmo com os problemas de construção de personagem de idade indefinida).

Sem falar no final que subvertia a busca de sustos como fonte de energia para a busca de risos. Uma mensagem positiva e feliz, como todo o filme.


Aqui é apenas uma turma de faculdade tipicamente americana.


Todo o espírito competitivo, o bulling, as irmandades, as festas, a busca de popularidade, os professores carrascos (muitas vezes lembrando cenas de Harry Potter, inclusive) etc. 

E onde o conflito e a solução é ser quem você é - semelhante a milhares de outros filmes e seriados americanos que se passam em colégios.

Bons momentos de sorrisos, mas sem o encantamento do original, que continuará sendo um ícone das animações dos anos 2000.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

A Bela que Dorme (Bella addormentata) - Marco Bellochio




Em cartaz em São Paulo o filme mais recente do italiano Marco Bellochio: A Bela que Dorme.

Após a boa repercussão com os excelentes Bom dia noite, Vincere e o experimental Irmãs Jamais, - já comentados aqui, Bellochio mais uma vez se inspira na realidade para criar sua ficção. 

A partir da discussão que houve na Itália com o caso de uma garota, Eluana, que teve morte cerebral e queria o desligamento de seus aparelhos e a decisão chegou a ser discutida no parlamento.

No filme alguns núcleos e visões como de um parlamentar que tem que ajudar a decidir a posição do páis em relação à eutanásia e o confronto da decisão com sua filha.

E o núcleo da própria menina em estado vegetativo e sua família, em especial sua mãe, vivida por Isabelle Huppert.

O filme tem idas e vindas e muitas pretensões em relação aos sentimentos e reflexões de cada personagem. 

A ética, o amor, a dor, a perda... Questões extremamente profundas e filosóficas, mas que se diluem um pouco em meio aos acontecimentos e tramas paralelas.

Excelentes momentos, mas perdidos entre cenas mais fracas e deslocadas.
Expectativa para um próximo Bellochio com mais vigor, potência e frescor como em seus anteriores!