sexta-feira, 17 de julho de 2015

Enquanto somos jovens (While we're young) - Noah Baumbach


O roteirista e diretor americano Noah Baumbach costuma mostrar habilidade em representar o cotidiano com realismo e humor. Filmes como Lula e a Baleia e Frances Ha - já comentado aqui - parecem crônicas da vida de muitas pessoas. 

Situações de separações, crises profissionais, crises de identidade, amizades... O olhar cuidadoso sobre essas passagens revelando detalhes e aprofundando as questões mas sem perder o humor é que parecem fazer sua marca.



Porém em Enquanto somos jovens Baumbach parece ter se perdido.

O conflito é muito interessante: um casal de meia-idade (vivido por Ben Stiller e Naomi Watts) que se vê em crise entre não se sentir nem tão "gente grande" bancando todas as responsabilidades, nem tão jovens para aceitar todas as novidades e fazer tudo com frescor. 


Assim eles vão se dividindo entre situações com os amigos de sua idade e um casal de jovens que acabam de conhecer e que começam a acompanhar.

Baumbach aproveita para listar todas as situações cômicas possíveis nessa intercalação, mas o resultado é uma sucessão de estereótipos e preconceitos,. 

Desde os jovens que ignoram a tecnologia e com isso parecem autênticos (apenas com isso) - apresentando quase um manual de comportamento hipster, ou os "maduros" perdendo a inocência de achar que ter um filho é apenas o paraíso (sem considerar o "padecimento").

Situações preconceituosas em relação a experiências lisérgicas e espirituais ou na relação dos personagens com a música e a dança.

Seja Naomi Watts aprendendo hip hop ou sua amiga levando seu nenê a uma aula de iniciação musical que parece um programa frenético de TV, algo como "Xuxa para baixinhos" com um nenê de colo. 

O filme se perde ainda numa discussão de criatividade pra falar sobre a relação das diferentes gerações com a autoria: o que se cria, o que se transforma, do que se apropria, o que se assina?

Questão extremamente pertinente e relevante, mas para a qual nem o diretor parece ter um posicionamento e assim vai desconstruindo a opinião de todos os seus personagens.

Começamos o filme sendo cativados e instigados por todos, mas terminamos com a sensação de personagens rasos e, ao contrário do que se espera (até pelo elenco), bem sem graça.


A temática, situações, tipo de cena, todo repertório de Baumbach está ali, mas sua abordagem dessa vez se perdeu... Que ele volte à sua jovialidade e frescor, mesmo que ele mesmo já não esteja assim tão jovem...

quarta-feira, 1 de julho de 2015

As vantagens de ser invisível (The Perks of Being a Wallflower) - Stephen Chbosky


Chbosky é um artista diversificado: assina livros, produções, roteiros e direções de cinema e TV.
Um de seus maiores sucessos foi o filme As vantagens de ser invisível, baseado em seu próprio livro de mesmo título.

O filme mostra o cotidiano de Charlie, um adolescente introspectivo que se sente deslocado na escola.

(Entenda-se aqui a escola tipicamente americana, com modelos, rótulos e turmas muito fortemente estabelecidas - ao menos como se vê na TV e no cinema).

Charlie é melancólico, já esteve em depressão e encontra consolo nos livros. Por isso uma das primeiras pessoas a quem se aproxima na nova escola é o professor de literatura, vivido por Paul Rudd.


Mas a vida de Charlie muda um pouco quando ele se enturma entre os desenturmados da escola.


Ali ele encontra um grande amigo, uma namorada e seu primeiro amor, vivido pela simpática atriz de Harry Potter, Emma Watson - também já vista por aqui em filmes como Bling Ring.


E assim completa a trajetória de um protagonista como a grande maioria dos filmes adolescentes.

O que começa sendo diferente: a não aceitação por ser diferente, logo passa à tentativa dele de ser diferente "daquela maneira", o que dá praticamente na mesma.

Nesse sentido há filmes muito mais profundos e com personagens igualmente (ou muito mais) carismáticos... Desde filmes que trabalham questões de gênero como Amigas de Colégio, Hoje eu quero voltar sozinho e Azul é a cor mais quente.

Mas também em filmes como Houve uma vez dois verõesAs melhores coisas do mundo, Antes que o mundo acabe, Os Inquietos, - muitos comentados por aqui. Ou mesmo a saudosa série Anos Incríveis.

As vantagens de ser invisível resulta sem graça, mas sua mensagem interessante parece tocar os adolescentes. Que seja uma semente para amadurecer então... O diretor e seu público...

segunda-feira, 29 de junho de 2015

A Teoria de Tudo (The Theory of Everything) - James Marsh


O diretor inglês James Marsh tem vários títulos em sua filmografia, em especial de documentários para TV e cinema. Na ficção é autor de King e de seu mais recente A teoria de tudo.

Aqui Marsh ganhou destaque por retratar a vida do inspirador Stephen Hawking e fazer um excelente casting com Eddie Redwayne no lugar de Hawking, que lhe rendeu diversos prêmios, inclusive o oscar.


O filme faz uma aposta interessante de se focar na história do casamento de Hawking: 

suas descobertas científicas e a relação com a doença são mostradas de maneira que enriquecem, problematizam e relativizam a vida do casal.

Mas como o grande destaque da biografia de Hawking são seus méritos científicos, nesse campo o filme é raso e o retrato da carreira do físico fica superficial.

As duas temáticas vão pouco a pouco concorrendo e nada se aprofunda, deixando o filme, em especial sua segunda metade, pouco envolvente.


Um retrato correto, mas sem muita graça, possibilitando novas tentativas a outros cineastas.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Winter Sleep (Kis Uykusu) - Nuri Bilge Ceylan


O diretor turco Nuri Bilge Ceylan vem produzindo filmes interessantes e densos nos últimos anos. Como Climas, com comentários aqui, Three Monkeys e Era uma vez na Anatólia, também comentado aqui.


Com seu último trabalho, Winter Sleep, Ceylan inclusive ganhou a palma de ouro em Cannes em 2014.

Winter Sleep apresenta realmente um primor de imagens, sons e tempos, mas lhe falta o naturalismo mais vigoroso das outras obras.

A apresentação profunda e lacônica de personagens, as lindas paisagens, os enquadramentos, o ritmo denso, tudo segue a linguagem de Ceylan.

Entretanto as relações entre as personagens são um pouco mais novelescas, o protagonista, Aydin, é um tanto manipulador e paternalizador e com isso não cria empatia e nos afasta um pouco da trama.

Aydin é um homem de meia idade que administra um hotel na Anatólia, nas planícies da costa ao sul da Turquia. Ali construções históricas se transformaram em acomodações para turistas aventureiros e em buscas de todos os tipos.

Aydin também administra sua relação com a esposa, que tem outra origem e interesses (mais humilde e mais ingênua e esperançosa em relação aos conflitos sociais).

E a relação com sua irmã, recém divorciada e frustrada com o mundo, inclusive com Aydin e a postura superior e alheia com que se coloca frente ao mundo.

Esses conflitos são desenvolvidos através de diálogos que trazem questões profundas e filosóficas, mas ficam no limiar do excessivo, ou "teatral".

Assim os pequenos incidentes, como a cobrança por parte de Aydin de um aluguel atrasado a uma família com poucos recursos ou a vingança de um menino que joga uma pedra em seu carro, nos instigam bastante mas sem que nos envolvamos emocionalmente com as personagens.

Podemos nos tocar e tomar partidos, mas de maneira mais racional, mais cerebral, como o tom das falas de Aydin.

Assim o filme se torna todo mais frio, fazendo jus ao seu sono invernal, mas não à realidade e ideias fervilhantes de Ceylan.

domingo, 7 de junho de 2015

Shame - Steve McQueen


Apesar de uma carreira com diversas realizações, principalmente de curtas-metragens, o diretor inglês Steve McQueen se destacou em 2011 com Shame, em que se aproxima de maneira ao mesmo tempo íntima e contida do personagem Brandon, vivido por Michael Fassbender.

Michael é um executivo bem sucedido, que parece destacado entre seus colegas, ou mesmo diante de sua irmã, que recorre a ele para se abrigar em sua passagem por NY.

Porém não há brilho nesse sucesso - o que é visto inclusive pelas cores pálidas e cinzentas do filme.

Nada irradia no filme, nem luzes, nem sorrisos, nem olhares... Raros são os momentos em que algo brote da selva de pedra da cidade grande, por isso a cena em que sua irmã canta tão cheia de sentimentos transborda na tela.

E o mérito do filme é justamente a economia, quase nada é dito, mas há muito revelado: o vazio da vida de Michael e a maneira como ele tenta preenchê-la quase pode ser sentido.

Suas perversões e vícios sexuais aparecem e refletem não o excesso (de seus desejos, atos ou o que quer que seja). Eles refletem a escassez (afetos que se intuem desencontrados em sua vida, desde a infância).

Nos envolvemos com esse vazio e a espécie de paralisia dos personagens principais e mesmo sem ter muitos dados sobre o contexto tudo fica dentro de uma organicidade, intimismo e densidade instigantes.

McQueen não alivia, não há qualquer redenção para os vícios, perversões e aprisionamentos. Poucas buscas, poucos sentimentos, mas uma medida precisa para nos apresentar sua história. 

segunda-feira, 1 de junho de 2015

O Sal da Terra (The salt of the earth) - Wim Wenders & Juliano Ribeiro Salgado



Wim Wnders é um cineasta irregular capaz de fazer obras-primas como Asas do Desejo ou Paris Texas - já comentado aqui, mas também capaz de filmes de questões interessantes mas que resultam mais confusos ou simplórios, como os recentes Land of Plenty, Palermo Shooting ou seu segmento em Mundo Invisível - também comentado aqui.

Wenders em geral se mostra como um grande observador do mundo em que vive, seja retratando dramas profundos e filosóficos, mas também retratando grandes artistas que conhece e admira, como o grupo cubano Buena Vista Social Club, a bailarina e coreógrafa alemã Pina (em documentário também presente por aqui) e agora o fotógrafo Sebastião Salgado.

O Sal da Terra mostra a bonita e tocante trajetória de Salgado, dirigida por Wenders e pelo filho do fotógrafo, Juliano Salgado, que juntos recompõe a vida do artista e acompanham seus trabalhos recentes.

Um dos méritos do filme é nos aproximar do tom da obra de Salgado (tanto das matizes de seu preto e branco, quanto do tempo de contemplação a que nos leva). 

Entretanto o filme não vai muito além da documentação. Não aprofunda questões extremamente densas presentes na vida de alguém que registrou cenas-limite de miséria, injustiça e sofrimento.

O filme cita que essas vivências o adoeceram, mas não problematiza nem como, nem quanto.

Também cita dificuldades de sua vida particular e doméstica: longos períodos de distância de sua casa e de sua família e o nascimento de um filho com síndrome de down, por exemplo, mas a maneira como isso pode ter repercutido em sua vida fica mais a cargo do espectador.


Inclusive podemos reviver o desespero do fotógrafo a nos deparar com suas fotos de pessoas à beira da morte, mas não compartilhamos do desespero dele...


O Sal da Terra traz mais a dimensão das linhas, curvas, luzes, sombras e muito menos a dimensão dos temas de Salgado e sua psicologia.

Uma pena, pois aí deve habitar uma imensidão muito mais tocante que montanhas, geleiras e florestas e que nos faria querer acompanhar mais de sua obra (que ainda é viva e ativa). 

Da maneira como colocado no filme tudo já parece estar resolvido: Salgado se aproximou ao máximo da morte (morte física de pessoas e povoados e também da civilização e da paz) e depois se recompôs através da vida (reflorestando amplas terras de sua família e fotografando a fauna, flora e paisagens). 

Uma trajetória nobre e admirável, mas que nos faz pedir mais, inclusive desse documentário...

Joven y Alocada - Marialy Rivas



Joven y Alocada é o longa-metragem de estréia da diretora chilena Marialy Rivas.

O filme traz questões profundas de descoberta de sexualidade, amor, triângulos, embates morais e religiosos etc, e os trata com humor e ritmo.

Porém o tratamento acaba fazendo com que o filme não se aprofunde em seus temas, mas que possa entreter como uma espécie de telefilme. 

Várias piadas, grafismos, narrações e outros comentários que se sobrepõe a narrativa (e de maneira mais próxima da publicidade e não como fez Gustavo Taretto em seu Medianeras - já comentado aqui).

Faz lembrar um pouco da narrativa dos curtas de Roberto Torero e de Jorge Furtado, mas não de seus longas, que se mostram mais ricos com o retrato do cotidiano.

De qualquer maneira filmes com temáticas jovem tem um público garantido e importante e em que se deve investir mais. Hollywood sabe bem disso, mas no Brasil, por exemplo, são mais esparsas iniciativas como As melhores coisas do mundo, Antes que o Mundo Acabe, Apenas o Fim, Hoje eu quero voltar sozinho, todos comentados aqui.