domingo, 24 de abril de 2011

Viajo porque preciso, volto porque te amo - Karim Ainouz


Fragmento do filme de fragmentos em seu trailer:
http://www.youtube.com/watch?v=wn4ZBttHVaU

No título a poesia do filme, promessa de uma história bonita...
O filme em si, como vi definido: um "road movie experimental". 


A história vem apenas em sugestões e fragmentos.
Em narrações e sons sem foco, em imagens com ruído.

Verdadeiramente bonito, mas me deixa com gostinho de quero mais!


Ainda mais pelos diretores: Karim Ainouz (de filmes fortes como Madame Satã e O Céu de Suely) e Marcelo Gomes (da obra prima Cinema, Aspirinas e Urubus) - tão sensíveis e talentosos (além da simpatia e singeleza).

Mas o projeto parecia ser isso mesmo: simples, modesto, singelo...
O que poderia vir maior em imagens para nos alimentar não chega, mas o tom é preciso: a nostalgia, sentimento, poesia, esses chegam, invadem, penetram...

Nos fazem viajar e voltar a ele... Como companheiros de viagem, seguimos com o filme dentro de nós... (e por isso o pesar de não podermos viajar mais com as imagens, com os fragmentos).



Viajamos porque ao ver o filme não pode ser de outra forma, mas o que nos faz voltar realmente é por outro motivo...

domingo, 17 de abril de 2011

Poesia - Chang-dong Lee



Tempo de digerir e assimilar, e esse é um filme que precisa bastante tempo. Mas vale a impressão fresca de sua beleza, força, intensidade... Filme que parece delicado, suave, trabalhando sutilezas poéticas, mas trazendo dramas profundos...



O Sul-coreano Chang-dong Lee retrata a vida de uma senhora em distintos detalhes de seu cotidiano, distintas notas, tons, versos...




Senhora que cuida de um neto adolescente sem qualquer valor; que trabalha como empregada de um senhor debilitado e desrespeitoso, que não encontra qualquer diálogo de sua sensibilidade com seu entorno...

A não ser nas aulas de poesia que começa a fazer...

Seu desafio é justamente fazer um poema, e ele vem na aridez desse seu mundo, visto com seus olhos delicados e poéticos e sem  qq perspectiva de redenção...

Não há solução nesse caos silencioso, não há final feliz, não há respiro de alívio...

O filme termina com a sensação de um nó na garganta que não se desfaz, por isso sua força...


E sua poesia tão simples, tão próximo e ao mesmo tempo tão distante...


Distante talvez pela cultura oriental tão distinta da nossa; distante por sua língua, por seus ideogramas; distante até por essa equipe que não conhecemos, de um diretor que não tão experiente e de uma atriz, Jeong-hie Yun - precisa e excelente - com uma bagagem de quase 200 filmes (!!!);


Distante talvez pelo denso universo dessa senhora, distante talvez pelo simples e sublime da poesia...
(trailler deixa a desejar perto do filme, mas dá pra dar um gostinho: 
http://www.youtube.com/watch?v=VM27hunyDTA)

domingo, 13 de março de 2011

Lixo Extraordinário

Filme simples: registro de projeto de um artista.


O interessante do filme é que o artista é Vik Muniz no maior lixão do mundo - o Aterro Sanitário de Gramacho - abordando pessoas de histórias duras, profundas, bonitas que convivem naquele espaço e se deixam ser fotografadas e ajudam a que essas fotos sejam reproduzidas com material reciclado tirado do lixão (!!!).



Os poréns - porque não sei viver sem eles - é que as histórias não são muito aprofundadas... Ainda mais pensando nesse ambiente e em filmes interessantíssimos como Boca de Lixo de Eduardo Coutinho.



Ou o instigante Estamira de Marcos Prado.




E outro porém ainda mais grave é que o registro de Lixo Extraordinário é manipulador demais. Ele mostra situações interessantes e delicadas, pois apresenta mundos diferentes a pessoas convivendo com um cotidiano duro e discutem a responsabilidade disso: apresentar possibilidades, mas não poder mante-las. 

Mas a conclusão que essas questões suscitam veem ditas pela narrativa do filme, desde detalhes como o próprio Vik Muniz se apresentando como o mais conhecido artista brasileiro no exterior.

E depois o que acho mais grave do filme dizendo que a atitude deles é nobre, é incrível, é isso e é aquilo...

Isso enfraquece as ações mostradas, pois o que isso gera, o que isso nos faz refletir, deve ser despertado em cada um e não ser narrado como optaram Lucy Walker, Karen Harley e João Jardim.



Faz lembrar de Pixote e repensar responsabilidades, atos nobres X atitudes paternalistas... Complexa questão...



Por isso que em meio a tanto material, se separa o joio do trigo, o extraordinário do lixo e se fica com a reciclagem de idéias e arte final emocionante!

sábado, 5 de março de 2011

Inverno da Alma


Não chega a me manter fria, mas digamos que em estado de mornidão...


Debra Granik conta a história de uma família no interior dos Estados Unidos em um clima de terra de velho oeste, lugar de crimes, pessoas duronas, xerifes... 

Mas em espírito contemporâneo, onde os crimes estão ligados ao tráfico de drogas, onde crianças usam armas para caçar esquilos ou se proteger de bandidos, adolescentes rebeldes e ousadas se veem refém do marido com gravidez indesejada, etc.


Quem protagoniza é uma jovem que se coloca como chefe de uma família de duas crianças, uma mãe com sérios distúrbios psicológicos e um pai ausente, ex-preso por tráfico e atual fugitivo.


Ela tem que resolver problemas de pobreza (frio, falta de comida, etc) e assuntos pendentes do pai (com criminosos). Para isso ela se mantém doce, atenciosa, mas firme e durona...




Com atuação boa, fotografia boa, filme em geral bom.




O problema é que algo aí não cola! Impossível se identificar e envolver com a falta de sentimentos colocada, e também não há uma representação mais caricata, interessante e inusitada como os irmãos Coen costumam fazer...



Fica um filme frio e invernal, onde há corpo, mas falta justamente a alma...

trailer do filme

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Discurso do Rei (King's Speech) - Tom Hooper



Mérito de Tom Hooper por dirigir competentemente um filme sobre situação verídica vivida pelo rei George VI, que sofria de gagueira e teve que superar seu medo de falar em público.

O filme traz personagens interessantes: além do rei (vivido por Colin Firth) que se sente intimidado com microfones; sua mulher que lhe apóia e muitas vezes toma sua frente (vivida por Helena Bonham Carter); e o interessante profissional que lhe aplica um tratamento de superação do trauma da gagueira, em um misto de psicólogo, fonoaudiólogo, diretor vocal, amigo... (vivido por Geoffrey Rush).


O filme é fiel a essa sinopse, nem mais, nem menos. Preciso. No melhor estilo britânico.


Bom. Sem deslizes e sem empolgações. Para gostar, mas de forma alguma para ganhar o oscar de melhor filme. Falta de filmes melhores no estilo "acadêmico"... 

(ao menos o estrangeiro fez por merecer:  http://diculturices.blogspot.com/2010/11/heaven-susanne-bier.html)

E pra quem quiser conferir:



domingo, 27 de fevereiro de 2011

José e Pilar - M.G.Mendes


Sempre interessante poder ter a oportunidade de ver bastidores daqueles que gostamos... Saber um pouco mais de Saramago, principalmente após a sua morte, tem uma emoção prazerosa...

Ainda mais porque vem em um documentário cheio das reflexões de Saramago e a jornalista com quem era casado, Pilar (já que no próprio filme reivindica mais do que o papel de "mulher").

O que fica mais forte pra mim é justamente um filme que retrata o fim de uma trajetória. Saramago já está debilitado e luta contra o seu fim. Luta de maneira consciente, como diz, não por temer a morte, mas por saber que é o fim, por tentar que dê tempo de realizar seus planos, seus desejos, (seu último livro - A Viagem do Elefante)...

E Pilar vem com a força de seu nome, pilar, dando força e sustentação a esses planos, mas tb colocando paradigmas... Afinal, o que é viver em busca de planos? O que são nossos sonhos? O q esperamos da vida?

Sem dúvida queremos uma vida cheia de realizações, mas a que custo? Desfrutar a vida, se dar ao direito de pequenos prazeres (caminhar, dormir, encontrar amigos, descansar...), também não seriam realizações?

Quem é essa mulher então ao seu lado? Aquela que lhe apóia e dá mais produtividade ou aquela que é controladora e lhe faz imposições de agenda e de ritmo?

Como vivemos essa contradição dentro de nós mesmo?

E o que esperamos do amor?

Ouvi comentários distintos a respeito do filme: uns que se surpreendiam com Pilar ao conhece-la (ver sua força, energia, importância) e outros se assustando (já que ela parece manipuladora e muitas vezes uma mera administradora de Saramago)... 

E tem um pouco das duas coisas, mas o que é nítido é o tamanho do carinho que Saramago sente por ela! Sentimos esse amor, em dedos que a afagam todo o tempo, na cumplicidade e até dependência durante as decisões e momentos de debilitação, me emociono com as declarações de amor a cada dedicatória de livro...

"A Pilar"
"A Pilar, meu Pilar"
"A Pilar, aquela que não havia nascido e tanto tardou a chegar"


O jovem diretor Miguel Gonçalves Mendes faz um retrato discreto, respeitoso, sem grandes interferências, mas delicado o suficiente para poder captar com proximidade esse momento tão intenso na vida do casal...

Momento de reflexão e despedida, que é o que fica para mim do filme...

domingo, 20 de fevereiro de 2011

O Mágico (L'illusionniste)



Bicicletas de Belleville é uma animações que consegue ser super singela e genuína ao mesmo tempo. Peculiar e muito graciosa: personagens originais, ritmo próprio, traço interessante, história original.

Com O Mágico (ou ilusionista, como no original), Sylvain Chomet aproveita roteiro de Jacques Tati, explora novas personagens interessantes e singulares, mas fica aquém...

Não define muito bem nem aprofunda a relação entre um generoso mágico e uma menina que se encanta com a possibilidade de uma nova vida cheia de "magias"...

A graça está em como o mágico tenta manter a crença da menina em seus truques, mas como para isso tem que se desdobrar... mas esse esforço não é tão explorado e a relação entre os dois também não é muito desenvolvida... 
Por isso quando há um rompimento na relação deles, não estamos muito envolvidos como espectadores e não há tanta comoção...


Fica um filme novamente muito estiloso, charmoso, elegante, mas com menos vida do que as bicicletas...


Que venham novas pedaladas, pois aí há um diretor com bastante criatividade, personalidade e potencial!

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Tropa de Elite - José Padilha

Em choque com o filme-fenômeno, tentei preparar meu arsenal para um ataque embasado, contundente, profundo...
Mas há tantas ambigüidades que vou ficar no nível dos desabafos e impressões mesmo...

O filme, assim como o primeiro, tem seus méritos: boas interpretações, ágil, envolvente... Carismas e talentos... Mas tem fragilidades e perigos... Principalmente pelo que se dispõe...

Não estamos apenas falando de aspectos fílmicos, estéticos, narrativos, estamos falando de um tema e discurso muito sérios! E com um diretor que sempre se pronuncia com muita propriedade e arrogância...


Dentre os méritos do diretor, José Padilha, enfatizo um industrial, de ter assumido, encabeçado e lucrado com a distribuição do filme, muito nobre ter enfrentado cartéis e ainda por cima para ter lucros! Genial! Que possa ser um exemplo a ser seguido: distribuir os próprios filmes e não deixar os lucros para distribuidores e exibidores!


Em seguida o filme extremamente competente que envolve a tantos, bate recordes de bilheteria e é sucesso nacional. Por isso mesmo uma responsabilidade da qual ele não pode se eximir...

No primeiro Tropa, Padilha dizia ter pensado o filme de maneira diferente, onde Capitão Nascimento não era o protagonista... Intenção ou não, o fato é que criou um filme cujo discurso é dado pela voz do protagonista, e é um protagonista extremamente carismático, com o qual nos encantamos e pelo qual torcemos, ou somos impelidos a... 

O problema é que esse protagonista q acompanhamos de maneira tão próxima também é fascista, que propaga em alto e bom tom que "bandido bom é bandido morto". Evidente que não é qualquer fala de um filme que faz parte de seu discurso, mas como esse tipo de jargão se tornou moda nacional com certeza é em parte responsabilidade dos criadores. 

A questão complexa onde se formaram quadrilhas e todo um sistema criminal (tráfico,roubos...), ñ tem solução fácil, ñ será simplesmente c/ sistema policial q reprima (pois é ineficiente), ou q mate (prefiro acreditar q superamos esse nazi-medievalismo).


Tampouco com organizações não governamentais que proponham programas assistenciais para que as pessoas possam ter alternativas de vida em meio à pobreza e à falta de perspectivas.

São ações e falas que fazem do filme algo leviano...


Tropa de Elite 1 nos mostra essa situação e nos leva a torcer pelo capitão que não tem paciência, não tem tempo a perder e propaga a eficiência anti-crime da caveira, da morte, do assassinato, do fascismo...

Me preparar para ver o segundo filme foi um grande exercício de abstração, pois o discurso do diretor Padilha e do ator Wagner Moura era de outras facetas, outros discursos, outros raciocínios...

O mais livre de preconceitos possível, lá fui eu...

De fato novos lados do mosaico-moeda, capitão Nascimento se aproxima do sistema político e passa a ver novas maneiras de tentar combater o crime. Bem interessante, mas...


Para mostrar o sistema político, Padilha se dispôs a mostrar também a corrupção do homem frente ao poder (realmente me pergunto se o homem é capaz de estar no poder e não se corromper, pois ainda não conheço exemplos possíveis... por mais que o socialismo seja mais justo ou que outros governos possam ser defendidos, nenhum ainda conseguiu essa nobreza). 

Capitão Nascimento vê então que através da política poderia tomar decisões para impedir crimes e dar melhores condições de vida às pessoas, mas diante de políticos corruptos, assassinos, ladrões, parece impossível. 

Mesmo com a presença de políticos honestos com falas coerentes, justas e sociais, pois é um discurso feito dentro de uma visão extremamente ingênua, quase patética (como se torna o personagem deputado Fraga).

Capitão Nascimento vem novamente com seu carisma nos fazer acreditar em seu discurso, suas palavras, seus atos, e age como um herói solitário, quase um cowboy do velho oeste que tem que fazer "justiça com as próprias mãos".

(inclusive bater, espancar, ameaçar e talvez até matar... porque é isso que esperamos numa continuação, ela venha a existir ou não, ela se dê dessa forma ou não)...

A humanidade dada a ele também com a (des)construção de sua vida pessoal tem uma narrativa fraca (com coincidências forçadas do novo casamento de sua ex-mulher) e não contribui muito.


Se o filme nos propicia pensar num futuro para o país, em alternativas para situações de crime, miséria e violência em que nos encontramos, não pode incentivar "justiças" desse tipo... Cada um por si matando a todos, onde nos levaria?



A política pode ter suas contaminações, seus percalços, seus equívocos, mas ser generalizada e ridicularizada como faz o filme, é um deserviço, principalmente em um país que já tem tendência a dizer que "político é tudo igual", que "votar não serve pra nada", etc.

Fortalecer esse discurso (e por coincidência no que foi um ano eleitoral) é irresponsável, e aí passo a essa crítica que é muito menos cinematográfica e mais de ideais de vida...

"Hay que endurecer pero sin perder la ternura", temos que combater, mas sem ser destrutivos... Nem matando como no Tropa 1, nem desqualificando como no 2... Haverá um 3 para um arremate redentor...?

Padilha instiga e estimula, então tomara que sim!
Mas que amadureça ainda mais...