Abdellatif Kechiche começou sua carreira como ator, mas há alguns anos vem se destacando como diretor, por exemplo com Vênus Negra e agora com Azul é a cor mais quente.
O filme, como o título original bem diz, conta a vida de Adèle, uma adolescente em seu despertar: descoberta dos amores, dos desejos, dos interesses, do trabalho...
A intensa vida na escola, a saída desse ambiente, a busca pelo caminho próprio, a tentativa da vida como professora, os grandes primeiros passos e tropeços.
Baseado em uma história em quadrinhos, o principal mérito do filme é narrar essa trajetória com realismo e delicadeza, ele se aproxima intimamente de sua protagonista.
(e essa intimidade se dá especialmente pela proximidade da câmera e pelos tempos quase reais de ações do cotidiano: comer, dormir, transar...).
A seleção de elenco e direção de atores é primorosa, em especial da protagonista, vivida por Adèle Exarchopoulos, que atua com espontaneidade e tem um enorme carisma.
Mais do que sua beleza ou simpatia, há um magnetismo que seus gestos provocam e que a câmera de Kechiche capta tão bem.
E seu talento faz com que a atriz se transforme a cada cena e pareça amadurecer em três horas os cerca de quatro anos que o filme narra.
A narrativa e a temática homossexual feminina faz lembrar outro filme muito especial: Amigas de Colégio do sueco Lukas Moodison que poderia ser um primeiro capítulo de Azul é a cor mais quente.
Entretanto aqui a maneira de retratar a história gerou polêmicas por desenvolver algumas cenas de maneira rasa e por reproduzir alguns clichês (e preconceitos?).
A grande mudança pela qual passa Adèle é a descoberta de sua homossexualidade e a vivência de seu primeiro amor.
Nesse enlevo e romance entre ela e a jovem artista universitária Emma há diálogos mais primários, nos quais Emma (e também seus amigos) se mostra canastra e sem profundidade, ao contrário, há uma pretensão intelectual mas que para conhecedores de arte podem provocar repulsa pela falta de originalidade e rasidade do conteúdo.
No decorrer do namoro, Emma também reproduz os clichês de uma relação machista e antiquada sendo descuidada, ciumenta, traindo, desprezando, negligenciando...
Mas absolutamente humana. Seja em sua pretensão ingênua artística, que a mim soa mais juvenil do que idiota. Ou na maneira como se coloca diante da companheira.
Um grande erro julgar o filme buscando nele um exemplar de uma relação entre mulheres (como fizeram ativistas gays e feministas).
Ele apenas apresenta uma possibilidade de relação, e faz isso de maneira tão palpável e graciosa que perdoável em deslizes e precariedades.
Ele apenas apresenta uma possibilidade de relação, e faz isso de maneira tão palpável e graciosa que perdoável em deslizes e precariedades.
Adèle e Emma são personagens absolutamente realistas e podemos reconhecer nelas vários amigos e amigas (ou a nós mesmos também).
Descobertas de amor, romance, relações amorosas são questões universais e o filme possibilita que muitos se identifiquem.
É extremamente poético e emotivo, e em seus tempos e espaços naturalistas nos leva para dentro da trama, nos aproxima de Adèle, nos faz estarmos enamorados por ela e junto com ela, e ao seu lado se angustiar, se dividir, se devastar...
Como não ficar ansiosa junto com ela durante sua paixão platônica por Emma? Como não se dilacerar com o reencontro nas cenas finais?
São necessários mais filmes como esse. Para nos conectar e trazer situações da vida para podermos nos emocionar e discutir, sem querer fazer deles bandeiras ou cruzes.
Fiquei particularmente impressionada com a atuação da protagonista, não por acaso "Adèle", atriz e personagem: muita profunda e verdadeira. Bela direção de atores. Também aguardo os próximos capítulos.
ResponderExcluirSua análise parece abarcar todos os lados e o centro do filme. De alguma forma sp acompanhando seus escritos, acho mto inspirador ver como vc foi sp melhorando e agora atingiu a excelência. Congrats.
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