quarta-feira, 17 de abril de 2013

Os Cinco Obstáculos (De fem benspænd - five obstructions) - Lars Von Trier e Jørgen Leth


Lars Von Trier é conhecido por sua mente inquieta e perversa.
Seja nas temáticas ou na forma como conduz suas narrativas (ou ainda nas declarações dadas em suas entrevistas).

Mas para o cinema isso rende grandes filmes, nos quais, ainda que não se goste, é impossível ficar indiferente.
Lars leva suas experimentações a extremos, seja sendo mentor do Dogma 95, uma das iniciativas pioneiras de se fazer filmes em outros custos e formatos (filmes rodados com câmeras digitais na mão em baixíssimo custo).


Seja nas experiências sem cenário de Dogville e Manderlay


Nas histórias traumáticas de Europa (um dos primeiros), Os IdiotasAnticristo ou Melancholia - já comentados aqui.

Também em flertes com diferentes gêneros, como no musical Dançando no Escuro.

eus jogos são explicitados por seu documentário Os Cinco Obstáculos, no qual convida um diretor dinamarquês que lhe inspirou muito, Jørgen Leth, mas que entrou em uma paralisia e ostracismo - como que a espera da perturbação de Lars (ao menos na versão do documentário).

Paternalismos e perversidades à parte, Lars realmente consegue instigar Jørgen Leth a recriar um de seus curtas - The Perfect Human - em diferentes formatos.

Lars lança novos parâmetros para a elaboração do filme em cinco novos obstáculos (cinco novos dogmas) e assim vemos um documentário sobre o processo de criação e as possibilidades narrativas cinematográficas.

Muito interessante para qualquer um que se interesse pela sétima arte e necessário para os que trabalham com ela!

Submarino - Thomas Vinterberg


Um dos principais nomes do Dogma 95,  o dinamarquês ThomasVinterberg é autor de grandes filmes como Festa de Família, Querida Wendy e o recente A Caça - já comentado aqui.


Sempre com temáticas conflituosas e personagens fortes, Vinterberg cria universos densos e intensos e nos traga para a reflexão.

É o caso de Submarino, de 2010.

Ali Vinterberg fala sobre dois irmãos tentando lidar com grandes traumas familiares do passado.

Morte, culpa, desafeto, raiva...

Os dois adultos seguem como duas crianças desamparadas e tentam buscar seu lugar no mundo, mas apenas conseguem se relacionar com outros "desajustados" (drogados, pervertidos, criminosos).

O filme poderia ser um festival de clichês exagerados, mas a frieza e naturalidade com que Vinterberg trata as personagens faz com que nos cativemos com a história e nos emocionemos com a agudeza dos fatos.


Excelentes atores, tempo preciso (respiros, montagem, planos, cortes), frieza na fotografia e no som...

Um resultado profundo, vigoroso e impactante, mostrando porque Vinterberg é um dos grandes nomes do cinema contemporâneo!


quarta-feira, 10 de abril de 2013

Loki - Arnaldo Batista - Paulo Henrique Fontenelle



Importante registro sobre um grande artista brasileiro em certo isolamento.

O isolamento que leva ao ostracismo, ou o ostracismo que levou ao isolamento... 

O documentário não apenas resgata a história do músico Arnaldo Batista, mas também faz do resgate um de seus temas. 


O reconhecimento como elemento importante no diálogo de um artista. Especialmente um artista que assumidamente diz que "não é melhor ser um normal".


O filme como os tantos documentários musicais brasileiros é um deleite aos ouvidos.


(reforçando mais uma vez a riqueza da música brasileira - vide os já comentados aqui: Tropicalia, Uma noite em 67 ou Raul, o início, o meio e o fim, este último também apresentando uma trajetória irregular, com um protagonista cheio de potencial e muito conflito envolvido)...


Além do grande trabalho de arquivo.

O diretor Paulo Henrique Fontenelle consegue apresentar o artista genial que não soube lidar com toda sua efervescência - como tantos!

Traz as pitadas do exitoso sucesso dos Mutantes, comentários sobre seu fim, as emoções intensas de Arnaldo após esse furacão e as mutações que vieram na sequência.

Desde dissolução da banda, casamentos, novos discos, depressão, acidentes, retorno, reconhecimento etc.

Interessante mosaico do mutante... E parece fazer juz à trajetória, seja no auge, na melancolia ou no saldo geral...

Sejam muito bem-vindos (Bienvenue parmi nous) - Jean Becker


O maduro diretor francês Jean Becker após dirigir o nostálgico Minhas Tardes com Marguerite, estréia agora no Brasil Sejam Muito Bem-vindos.

O convite é para adentrarmos na história de um velho pintor bem sucedido e com uma linda família. Sem problema aparente, as críticas a ele vão do capricho à depressão, mas sem que isso seja considerado uma doença séria e incapacitante.

O problema então se volta a ele, todos parecem esperar exclusivamente dele a solução.

Sem encontrar saída, ele resolve fugir e na fuga ocorre um encontro.

Uma adolescente abandonada por sua família e totalmente sem rumo...

Dois perdidos que se encontram.

O encontro, as personagens e as situações entre eles tem certa graça, mas não avançam muito. As resoluções ficam todas no clichê e o que teria potencial para o desenvolvimento de questões profundas e complexas ficam no nível superficial e com saídas fáceis.

Uma pena...

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Dentro da Casa (Dans la maison) - François Ozon


Um dos diretores franceses mais ativos e criativos da atualidade, François Ozon, é autor de diversos curtas e longas. Um de seus primeiros destaques foi com o estranho e estimulante Gotas D´água sob Pedras Escaldantes, baseado em uma peça do alemão Rainer W. Fassbinder.

De lá pra cá Ozon tem variado sua produção entre filmes mais densos de tramas psicológicas, como Sob a Areia, Swimming Pool e O Tempo que Resta.

E filmes em que combina as questões psicológicas com experimentos de linguagens, seja trafegando por diversos gêneros, como o musical 8 Mulheres, ou também em narrativas não lineares, como em O Amor em 5 Tempos.

Em seu novo filme, Dentro da Casa, Ozon traz novas brincadeiras de linguagem, se inspirando no livro do escritor argentino Juan Mayorga e tematizando a metalinguagem da elaboração de uma história.

No filme, um professor de literatura começa a comentar textos de um aluno sabendo que esse aluno se inspira na realidade.

Portanto, comentários sobre construção de personagem se tornam, na verdade, comentários sobre as pessoas envolvidas, e sugestões da trama podem acabar tendo resultados mais graves do que a mera ficção.

Para deixar a narrativa mais instigante, Ozon constrói as cenas sem deixar claro se está tratando da realidade do filme ou a ficção do garoto, se é a narração do que o garoto vê ou versões que ele cria...

Ficamos inebriados em um labirinto de possibilidades bem interessantes.

O porém é a trama se alongar um pouco e o "jogo" perder um pouco sua força ao longo do enredo. Terminando de maneira um pouco abrupta e chegando a sugerir clichês (de índice de livro psicanalítico)

Mas com boa criação estética e um elenco tão bom, tendo à frente Fabrice Lucchini, também destaque de seu outro filme  Potiche - Esposa Troféu - já comentado aqui.


E a excelente Kristin Scott Thomas, de obras como A Chave de Sarah e o maravilhoso Há Tanto Tempo que te Amo, já comentados aqui.

Dentro da Casa planta possibilidades bem interessantes e mostra novamente o potencial de Ozon...
Esperemos o próximo!


terça-feira, 2 de abril de 2013

Depois de Lúcia (Después de Lucía) - Michel Franco


Segundo filme do diretor e roteirista mexicano Michel Franco, Depois de Lucia ganhou destaque após ser premiado em Cannes em 2012.

O filme aborda de maneira ao mesmo tempo intimista e com distanciamento a vida de uma adolescente que tenta seguir sua vida normalmente após a morte de sua mãe.

Ela e o pai mudam de cidade e tentam recomeçar. O pai escorrega diversas vezes em suas tentativas, mas a garota parece não fraquejar.

Se adapta bem ao novo ambiente escolar, se enturma rapidamente e ainda tem energia para cuidar do pai e cobrar reações dele.

Entretanto, ao ter que tomar atitudes para se colocar, para exigir que a respeitem e reagir contra as situações cruéis a que adolescentes podem se expor.

bulling aqui chega a agressões físicas e abusos sexuais e a menina não consegue reagir.

Um filme difícil de se assistir e de acompanhar. 

Extremamente duro seguir uma personagem que nos cativa de início não só por seu carisma, mas também por sua energia e que de repente estagna.

Incômodo semelhante ao comentado na crítica de Super Nada, post anterior do blog.

O estado de espírito prostrado da menina quase nos asfixia (em citação às cenas aquáticas do filme, que fazem lembrar outro maravilhoso filme sobre depressão:

O Estranho em Mim, já comentado aqui ou até mesmo a obra-prima A Liberdade é Azul, de Kieslowski).

Vamos nos aproximando da menina em silêncio, tentando interpretar seu silêncio, em como se dá sua dor, por onde transbordará em um cotidiano prosaico de escola e casa... 


Cotidiano bem construído: interpretação, construção de personagens, apresentação de cenários, construção sonora, montagem, fotografia, arte... 


Mas logo o cotidiano se mostra mais duro e passamos a olhar a menina mais de fora (relações com os  brasileiros As Melhores Coisas do Mundo de Laís Bodanski - comentado aqui - e o começo de Bruna Surfistinha de Marcus Baldini)

Outros elementos narrativos vão sendo dados (detalhes sobre a morte da mãe e de personagens ao redor), e as situações vão se tornando extremadas (ainda verossímeis, mas bem radicais: sexo, drogas e violências explícitas e implícitas do universo adolescente), chegando a um final irreversível e sem muita redenção.

Triste. E inquietante.

Muito bom filme, que poderia ter algumas lapidadas, mas mesmo assim emociona e faz pensar...