quarta-feira, 29 de agosto de 2012

360 - Fernando Meirelles


Grande diretor, Meirelles segue em carreira ascendente, desde as experimentações televisivas fosse com  Ernesto Varela ou Ratimbum

Passando pelo estrondo que o destacou no cinema nacional e o revelou para o mundo, Cidade de Deus, ou em suas ambiciosas incursões internacionais, como Jardineiro Fiel (sua melhor experiência) ou Cegueira...

Meirelles - assim como nosso outro diretor internacional, Walter Salles, recém comentado aqui - se coloca na estrada, neste caso, mais precisamente na ponte aérea. 

Seu novo filme, 360, tem um alto grau de ambição: pretende dar a volta ao mundo em um filme multiplot, com personagens (e atores) de diversos países.
Anthony Hopkins, Rachel Weisz, Jude Law, Jamel Debbouze, Maria Flor...

Filmes como esse tem sempre a difícil tarefa de ir além da colcha de retalhos, superar os pequenos trechos de história e plantar um algo mais... 

Como o mestre dos multiplot Robert Altman soube fazer em filmes como Short Cuts, ou no excelente Felicidade de Todd Solondz ou ainda o interessantíssimo Antes da Chuva de Milcho  Manchevski, já comentado aqui


Para um bom filme multiplot é preciso além de boas pequenas histórias, que neste caso foram inspiradas por Arthur Schnitzler, autor bastante explorado por cineastas (como, por exemplo, Stanley Kubrick, conforme comentários feitos aqui). 

Além da multiplicidade, é preciso dos plots, dos conflitos, dos enredos... É preciso da maestria para construir lacunas, sementes que não poderão se desenvolver longamente, mas que poderão se manter presentes ao espectador...

360 esboça percursos intrigantes, densos, envolventes. A direção de atores e o ritmo instigam verdadeiramente. Mas a narrativa não convence... 

Talvez o roteiro (de Peter Morgan) que tenha buscado além de voltas, também reviravoltas em 360 graus, deixe o filme sem grandes curvas, e com amarras caretas, que buscam um sentido entre todas as histórias e acabam parecendo uma moral reducionista (uma das falhas também de Cegueira, no discurso final da personagem de Danny Glover ou outros filmes semelhantes como Babel, de Alejandro Iñarritu).

Explorar personagens que passam por nossas vidas, nos mostrando apenas um recorte, com todas as curiosidades e profundidades possíveis é interessante.

Mas tentar conectar a todos, dar sentido, explicar (como na péssima fala da terapeuta) em uma chave realista resulta em um filme um pouco morno, que roda e para no mesmo lugar...

Afinal, as personagens despedaçadas e em conflitos, já estão unidas por sua busca por amor (em seus casamentos, suas separações, seus romantismos, suas famílias, a si próprios...). 

Independente das histórias diversas de prostituição, perversão sexual, abandono, alcoolismo, tráfico de drogas, há melancolia em todas elas, certo sentimento de estrangeirismo e de busca...

Por isso a sensação de certo desperdício de sementes plantadas e da mão de um diretor tão bom, o potencial estava ali...
Que venham então os próximos!!!


terça-feira, 28 de agosto de 2012

Na Estrada (on the road) - Walter Salles


Quase sempre "na estrada", seja na "estrada"marítima entre Brasil e Portugal do belo e vigoroso Terra Estrangeira, seja na estrada clássica e muito bem realizada da Central do Brasil até o sertão nordestino;

Seja na estrada internacional e sem grandes conflitos e em certo desperdício de personagens de Diários de Motocicleta ou agora, inspirado pelo romance de Jack Kerouac, On The Road, é aí que Walter Salles parece estar em "casa".

Walter conhece esse caminho, e construiu personagens interessantes por espaços bonitos e bem narrados, 

mas a maneira de percorrer a estrada sem tantas curvas, como se sempre fosse a espera de uma descoberta, a espera de algo, deixa o filme sem tanta força.


Ele tateia uma linguagem diferente, mais jovem, mais misteriosa, mais poética...



E nesse aspecto o filme é bem envolvente: movimentos de câmera, fotografia, trilhas, arte, direção de atores... 

Aliás, bem variados e bons, dos mais comerciais aos mais cults, dos mais novos aos mais experientes.

O que falta ao filme é trazer mais corpo nessa poesia, deixar o etéreo mais palpável... Grande desafio, mas que poderia ter feito do filme algo mais impactante...

Mas Walter Salles sempre acrescenta, não importa a estrada, e que sua trajetória seja bem longa!

Um Mundo Secreto - Gabriel Mariño



Estreia em longas-metragens do jovem diretor mexicano Gabriel Mariño, que aponta uma trajetória bastante promissora... 


Um Mundo Secreto conta a história de uma jovem de classe média perdida, perdida após a formatura do colegial, perdida sem a clareza de um rumo para o futuro, perdida em uma viagem aventureira (buscando libertação? ou vínculos?), perdida em seus pensamentos, perdida na dificuldade de agir de acordo com as convenções, perdida na dificuldade de se relacionar com o mundo, perdida em seus sentimentos prestes a extravasar...


Poderia resultar em cenas clichês de uma geração indie, mas não...

Filme feito de maneira simples: equipe pequena, poucos recursos, muita raça, que se refletem no filme pelo tom intimista, as imagens e metáforas fortes, a intensidade da história e das personagens, o frescor do ritmo (embora também tenha seus problemas). 

Faz lembrar outro exemplar, já da década passada, da argentina Lucrecia Martel, a obra-prima O Pântano, já comentado aqui.


Salve o cinema latino-americano! E que venham mais!

domingo, 15 de julho de 2012

Deus da Carnificina (Carnage) - Polanski


O controverso, irregular e muitas vezes genial diretor Roman Polanski lança seu novo filme por aqui: Carnage - Deus da Carnificina
Baseado na peça teatral de Yasmina Reza, que pelo filme se intui ser muito boa, Deus da Carnificina  como filme é mediano.


O filme funciona em seu caráter intimista, simples, doméstico e cotidiano. 

Também funciona o quarteto de atores: Jodie Foster, Kate Winslet, Christoph Waltz e John C. Reilly, que variam muito bem entre o drama realista, farsesco e cômico... 

Dentro da variação de tom dos atores também instiga a dinâmica narrativa entre eles, os momentos em que apóiam e se atacam, quando estão aliados, agressivos, acuados, conciliadores ou solitários...

Porém, a história dos dois casais que se reúnem para discutir e pensar intervenções possíveis entre uma briga ocorrida entre seus filhos adolescentes, exagera no tom em alguns momentos, parecendo um pouco estriônica. 

E também falha em não adaptar melhor certo vai-e-vem de ações que nas limitações espaciais de um teatro são aceitáveis, mas que aqui ficam forçadas e artificiais nos afastando um pouco da trama. 

Faltam espaços, tempos e ações para que essa tão boa história, sobre atos contemporâneos, falsas morais e a complexa discussão sobre o politicamente correto se dê e preencha completamente a grande tela de cinema...


sábado, 7 de julho de 2012

Weekend - Andrew Haigh


Andrew Haigh aproveitou sua vasta experiência em assistência de direção e outras funções em produções hollywoodianas como Gladiador ou O sorriso de Monalisa para fazer um filme bastante intimista e autoral: Weekend.

Segundo longa de Andrew, Weekend mostra bem de perto um final de semana na vida de Russel, um jovem sem família e de poucos mas fiéis amigos, que vive uma vida simples como salva-vidas em uma cidade da Inglaterra. 

O foco dessa narrativa está em sua vida afetiva, quando em uma balada se vê atraído por Glen. 

Se segue a história de um final de semana com duas pessoas se conhecendo: descobrindo encantamentos, diferenças, ressalvas... Mas com o diferencial de serem dois homens e isso ser tratado de maneira terna e extremamente natural e realista. 

Oportunidade rara que faz lembrar o premiado curta brasileiro Café com Leite, de Daniel Ribeiro, e oportunidade que vale a pena ser conferida!



Partilhamos cenas de balada, sexo e drogas, e, principalmente, as conversas intimistas entre os dois rapazes.

(Novamente lembrando os "filmes de DR": Antes do Amanhecer/Pôr do Sol, de Richard Linklater, citados no post anterior sobre Apenas uma Noite).

Em Weekend também partilhamos as visões sobre o amor e relacionamentos, as experiências anteriores, as memórias sobre a descoberta da sexualidade, as dificuldades e conquistas (sempre no contexto das relações gays)... 

Nessa apresentação a timidez de Russel aparece dentro de uma base bastante sólida e o aspecto "descolado, desinibido e alternativo" de Glen vai aos poucos se revelando mais vulnerável.

Quase chega a se exceder de maneira um pouco caricata, mas no contexto da juventude, radical e enérgica para defender seus ideais e espaço, em especial por se tratar de um espaço ameaçado pelo preconceito (contra os homossexuais, que parece muito bem retratado no filme), nesse contexto está coerente. 

Também pelo contexto da trama, pois, como o próprio Glen diz no filme, quando se conhece alguém você começa a se reconstruir e se reafirmar a partir da nova relação. 

Nesse sentido, Glen parece muitas vezes revelar mais aquilo que quer ser do que aquilo que propriamente é...

Deixando assim seu futuro sem um rumo muito definido... E a despedida entre os garotos, após o intenso "Final de Semana", não adquire também um tom tão definitivo. Vale a imaginação do espectador para preencher as lacunas...


terça-feira, 3 de julho de 2012

Apenas uma noite (last night) - Massy Tadjedin


Estréia na direção de Massy Tadjedin, iraniana sem muita relação com o cinema de arte de seu país e sim com romances americanos - ou ingleses, como é o caso.

Apenas uma noite tenta pegar carona em filmes de relacionamentos e "DR" como Closer.


Mas partindo de uma situação clichê - o desejo extraconjugal - e sem densidade e criatividade nos diálogos ou expressividade, carisma e variações de suas personagens, acaba se tornando um filme sem graça, previsível e o pior: moralista.

A ambição parece ser de trazer novas luzes e posições em relação à traição, mas a narrativa se perde em tantas voltas que dá um tiro no próprio pé. 


(e fica cansativo e repetitivo, visto inclusive pelas fotos ao lado)

Nos diálogos conceitos como o de que o passado de uma pessoa com seus amantes anteriores sempre vão te perturbar e por isso não vale a pena a tentativa da conquista.

E ações que complementam o moralismo tedioso revelando a fragilidade da forte femme fatal, colocada como a mulher de decotes e lábios fartos sempre ao redor do marido para lhe tentar; 


O marido carinhoso e companheiro com sua esposa, mas também frágil e refém da tentação;

A esposa com criatividade e brilho estonteante (que só aparecem nos diálogos das demais personagens e não em cena, as qualidades são descritas, mas nunca colocadas em ações 

- por mais que Keira Knightley tenha de fato grande fotogenia (já que não apresenta muitas variações e se perde em estrionismos, também mostrados recentemente em Um Método Perigoso, também comentado aqui); 

E por fim o ex-affair juvenil da esposa, mantido em segredo para não perder a magia e permanecer como sonho, já que também é descrito (novamente descrito e não mostrado) como pessoa instável e inconstante.

O filme deixa apenas a semente de diálogo com filmes que trazem essas questões à tona, mas com mais graça e complexidade, seja nos jogos presentes em Closer, nas questões complexas de Fatal, em diversos exemplos franceses (como as estreias recentes de Verão Escaldante ou Adeus primeiro amor)...


Ou ainda no realismo de Antes do Amanhecer/Por do Sol, (que, aliás, promete sua continuação para breve)... Esperemos então... Que venham outros exemplares para os apreciadores de filmes-DR (também conhecidos como romances de bons diálogos)!