Baseado em fatos reais, Vitória conta a história de uma senhora que foi testemunha ocular do crescimento e banalização do crime no Rio de Janeiro. O tráfico sendo comercializado à luz do dia, indiscriminadamente.
Indiscriminadamente, palavra que resume um tanto a situação, parece ter o crime em seu centro, mas de forma disfarçada, negada, sem ordem ou controle... Mas pior, um controle pulverizado, de todos que tentam se beneficiar de sua propriedade.
A denúncia da senhora motivada pela sua busca de sossego e normalidade, de uma vida que não precise ser interrompida por tiroteios a todo momento, mas que vai de desenrolando em uma denúncia muito maior, envolvendo uma rede de tráfico, de policiais, de políticos... O estado atual do crime organizado.
Alguém da sociedade civil não pareceria ter voz para se levantar contra nada disso, mas acontece. E apenas alguém muito autêntica, como é o caso de Dona Antônia, vivida bravamente por Fernanda Montenegro.
Fernanda é uma atriz ícone, não há dúvida de sua grandiosidade, mas é lindo vê-la brilhar. Aqui, nos holofotes sombrios das tomadas sem muita luz, dos gestos que se veem eloquentes num virar de olhos, na respiração mais tensa, no colar de cacos da xícara e da vida da personagem...
(Faz lembrar da Fernanda Montenegro que separava feijões com Gianfrancesco Guarnieri em Eles não usam black-tie de Leon Hirszman, em 1981).
Vitória dá destaque à história, às personagens, às intimidades envolvidas pelos morros cariocas. Toda sua direção é econômica mas muito precisa e aí está sua força, o filme não se perde em acrobacias narrativas ou de cena, nada é gratuito, tudo se encaixa e se amarra, apenas no desencadear de fatos, sem malabarismos.
E assim o filme fica íntimo, mas potente, não apenas com a protagonista mas com todo o elenco, não apenas no clímax e em cenas de ação ou reviravoltas, mas também no cotidiano, nas reuniões de condomínio, nas amizade com um dos meninos que vive a vulnerabilidade da vida no morro, vivido por Thawan Lucas, ou com uma mulher trans que busca alternativas para uma vida digna e segura, vivida por Linn da Quebrada, ou ainda na parceria fundamental com o jornalista que assegura sua vida e sua história, vivido por Alan Rocha.
Belo trabalho de Andrucha Waddington.