sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Dos Hermanos de Daniel Burman

Daniel Burman pode não ser extraordinário, mas no alto dos seus 37 anos já apresenta uma filmografia considerável e bastante simpática.

Já falei sobre a força que tem O Abraço Partido, a simpatia com que me identifico com As Leis de Família e Ninho Vazio. Agora é a vez de Dois Irmãos.

Aqui Burman flerta mais com a comédia, em personagens mais caricatos, mas também com suas complexidades, dramas e complexidades...
Dois irmãos bem diferentes que começam a enfrentar as crises da terceira idade. Sem muito contato com amigos, colegas de trabalho ou outros familiares, eles acabam se apoiando um ao outro, vivendo uma relação de amor e ódio, cansaço e dependência...



O filme se enfraquece um pouco por sua semelhança com teatro: muito diálogo, pouca ação, licença poética de monólogos teatrais diegéticos e musical nos créditos finais. Mas ainda vale o tema, a interpretação muito boa dos atores e o realismo e doçura com que Burman sempre constrói seus filmes...

Avante, Burman!

Milcho Manchevski


Um dos filmes que mais me marcou no início dos anos 90 foi Antes da Chuva do macedônico Milcho Manchevski.




Ele foi uma das primeiras pessoas a me mostrar a força do ponto de vista em uma narrativa audiovisual:


Em Antes da Chuva vemos a história de uma menina se refugiando em um monastério em uma cidadezinha no interior da Macedônia. 




Em seguida vamos para um ambiente urbano onde vemos um casal de jornalistas. 


E por fim a história desse jornalista em sua aldeia natal, a mesma onde está o monastério.




As histórias assim vão se conectando e nos transmitindo diversas informações em camadas. Nossas impressões do primeiro contato vão se transformando, se aprofundando, nossos julgamentos à primeira vista vão tendo que ser revistos e tudo adquire uma complexidade extremamente interessante.

Esse universo e construção me fascinam, até fizeram parte do meu trabalho de conclusão de curso no curso de audiovisual na ECA-USP.

Ou seja, sobravam motivos para ver o último filme de Manchevski, Mothers. Até porque na sinopse se fala novamente sobre pontos de vista e hibridismos...

Porém, uma verdadeira falácia.

O filme começa com um curta: duas meninas fazendo falsas acusações de abusos e incriminando um inocente. A pequena história é bem contada, bem dirigida e deixa uma semente bem interessante no ar. 



Passamos daí a jovens fazendo registros cinematográficos em aldeias quase abandonadas no interior da Macedônia.



Abordagem intimista, afetuosa, simpática. Apesar dos jovens deixarem a desejar na atuação e de não entendermos bem o foco e a abordagem, o contexto geral cativam.


Entra então a terceira história, e aí o filme se perde COMPLETAMENTE.
Um documentário sobre uma condenação que se investiga ser falsa ou verdadeira.


Nessa investigação um excesso de depoimentos gerando uma grande colagem que impedem que se crie empatia com qualquer depoente, ou mesmo com o caso. Ainda mais com trilhas excessivas em quantidade e qualidade. Uma abordagem extremamente pobre, digna de jornalismo sensacionalista. 



Me pergunto se Manchevski teve a oportunidade de ver o genial Na Captura dos Friedmans de Andrew Jarecki, um exemplo de investigação sobre investigação, com depoimentos contraditórios e complexa apresentação de um caso...




Mothers então segue e aguardamos o fim da sequência policialesca e uma amarração do filme, mas não há, apenas uma frase que vem como uma bula-moral-da-história fraca e amadora, é didática, não dá margens a reflexões e faz parecer que o filme é ainda mais gratuito e mal amarrado...

Decepção...

Só espero que o erro tenha sido a exceção na carreira do diretor e não o brilhante acerto de Antes da Chuva...

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Cildo


Vi há algumas semanas já, o que por um lado deixa a experiência mais fria, por outro faz com que o que tenha ficado possa ser avaliado ainda mais criticamente... 



"Vão-se os anéis, ficam-se..."
...Algumas declarações de Cildo, sua energia, poesia, originalidade, reflexões, divagações...

O filme faz o registro de tudo isso e tenta captar a magia da obra, mas o desafio não era fácil, afinal, as obras estão lá: plásticas, conceituais, etéreas, para serem vivenciadas em um tempo e espaço específicos e que parecem não pertencer ao da obra audiovisual, onde eu como espectadora fico rígida aceitando o ponto de vista colocado pelo diretor - o estreante Gustavo Rosa de Moura.

E o próprio Cildo tem uma força e uma filosofia que no início estão bem amarradas, lançando bem as primeiras idéias no filme. (Por exemplo, da experiência de Cildo com a chegada do homem à lua, onde um dos astronautas estava lá, mas não compartilhou a experiência de ter pisado no solo lunar e por isso ter ficado de fora da repercussão e consequente fama).


Porém aos poucos as filosofias vão crescendo e a conexão com suas obras não combinam com um audiovisual descritivo, que apenas apresenta o áudio de suas falas combinado às imagens em 2D de suas obras...

Acaba se tornando uma experiência menor, que nem traz riquezas novas por ser um novo produto artístico, nem consegue captar o que é o Cildo artista plástico...

Vale por deixar o gosto a se conhecer mais no ao vivo e a cores...
Bora sair do cinema e ir ao museu! 
(e depois voltar ao cinema pra sétima arte...)