Um retrato da complexa simplicidade do dia a dia. Ou da simples complexidade?
Um filme das individualidades dentro de um coletivo ou do coletivo que se reflete em cada individualidade?
Uma narrativa sobre o prosaico do cotidiano ou sobre o imensurável terror dos pesadelos e brilho dos sonhos?
Marte um parece tudo isso. E muito mais.
Despretensioso, mas de uma profundidade ímpar.
Em seu encadear quase desconexo chega em um dos resultados mais coesos e tocantes do cinema brasileiro recente.
Marte um é o sonho de um menino, mas é também o contraponto do sonho de um pai, tem a cumplicidade dos sonhos da irmã e a redenção das aflições da mãe. Marte um fala de desejos e imaginários, mas apresentados através de um cotidiano extremamente concreto.
Tem as notícias de TV, nosso presente político, os programas de sucesso, a ética e a estética vivida, as possibilidades postas, as pautas de costume, as contraposições das minorias (diferenças de classe, aceitações e ressentimentos, lutas de acesso, quebras de barreiras e preconceitos, modas, sexualidades, paixões - inclusive a "nacional", culturas, vícios, perdições, religiões, amizades, família).
Tem uma boa construção de ambientes e momentos primorosos do elenco.
Tem drama, tem humor, tem realismo, tem poesia.
Tem um índice de questões psicanalíticas postas: enfrentamento aos pais, narcisismos, pulsões de vida e morte, ninhos vazios, angústias, amores.
Tem tudo isso e sem ser didático. Um filme singelo e afetuoso.
Pode causar estranhamento, demorar a aquecer, mas a emoção com certeza chega, quiçá até arrebatando!